VOTO ZERO significa não votar em fichas-sujas; omissos; corruptos; corruptores; farristas com dinheiro público; demagogos; dissimulados; ímprobos; gazeteiros; submissos às lideranças; vendedores de votos; corporativistas; nepotistas; benevolentes com as ilicitudes; condescendentes com a bandidagem; promotores da insegurança jurídica e coniventes com o descalabro da justiça criminal, que desvalorizam os policiais, aceitam a morosidade da justiça, criam leis permissivas; enfraquecem as leis e a justiça, traem seus eleitores; não representam o povo e se lixam para a população.

quarta-feira, 16 de agosto de 2017

CANDIDATURAS AVULSAS OU INDEPENDENTES

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ZERO HORA 16 de Agosto de 2017. ARTIGOS


ANTÔNIO AUGUSTO MAYER DOS SANTOS



As candidaturas a cargos eletivos no Brasil são exclusivamente partidárias. Mesmo que esse assunto seja inteiramente regulamentado (a nosso ver em demasia), o Brasil é um caso histórico e indisfarçado de subdesenvolvimento partidário. Agremiações surgem e desaparecem ao sabor de circunstâncias ou necessidades ditadas pelo poder. A debilidade do sistema é alarmante. Daí as propostas formuladas no Congresso Nacional a favor das candidaturas apartidárias ou avulsas serem válidas.

Todas questionam conceitos tradicionais tidos e havidos como intocáveis que se encontram mumificados desde a década de 40 do século passado. Suas justificativas são pertinentes. Afinal, a rotatividade no poder seguirá ininterrupta. Governantes e legisladores continuarão sendo sufragados periodicamente. Contraditórios, desacreditados, desagregados internamente e envoltos em escândalos praticamente incessantes, a maioria dos partidos brasileiros não instrumentaliza eficazmente o princípio democrático que lhes é atribuído. Mesmo diante de índices drásticos de rejeição, negligenciam reinventar-se. Estão voltados principalmente para a preservação do mercado político-eleitoral. Giram em torno de si próprios. Não captam as demandas sociais mais latentes.

Embora os partidos sejam relevantes para a legitimação do poder estatal, o palco democrático comporta a presença de outros partícipes para atuar na cena política, tais como entidades e instituições. Assumir um mandato sem filiação partidária não é circunstância que desnature a legitimidade do eleito. Expressiva parcela do mundo civilizado funciona assim. Por quê? Porque eficiência e resolutividade são atributos próprios do mandatário e que obviamente independem da partidarização.

Não se trata de pregar a abolição dos partidos ou torná-los decorativos. Longe disso. A motivação inata das propostas é pela inclusão e não exclusão de candidaturas. Todas introduzem novos conceitos para a representação popular. A realidade brasileira, tanto na sua dimensão social quanto na política, para reagir à mesmice dominante, necessita ?revigorar os partidos e, ao mesmo tempo, permitir a expressão eleitoral de forças que não se sentem representadas no atual sistema partidário? (PEC nº 41/11).


Advogado e professor de Direito Eleitoral


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA -  Totalmente a favor da candidatura avulsa ou independente, diante do descrédito nos partidos políticos, das suspeitas de envolvimento dos partidos com as máfias corruptas e corruptoras, das atividades imorais e corrupta  dentro dos partidos para atender objetivos de poder e verbas públicas, e da prática dos partidos de aliciar, de aparelhar instituições, de submeter empresas públicas e de transformar seus filiados em funcionários a serviço do interesse partidário e corporativo em detrimento dos deveres de representar o povo, de fiscalizar os poderes e de legislar em defesa do povo.

quarta-feira, 2 de agosto de 2017

OS GOVERNOS E SEUS POTENCIAIS DE ESTRAGO






ZERO HORA 02 de Agosto de 2017. INDICADORES


Ricardo Hingel, Economista




Estive recentemente de férias nos Estados Unidos, quando presenciei estradas cheias, restaurantes lotados, shoppings e outlets movimentados, ou seja, uma vida de normalidade, passada tanto a grande crise econômica iniciada em 2008 quanto as incertezas representadas pela eleição de Donald Trump.

Passado o susto inicial com Trump, fica evidente que lá a economia é muito maior do que seus governantes e o potencial de estrago que ele poderia causar era bem menor do que seria em economias menos consolidadas. Mesmo com a alta impopularidade de Trump, não há instabilidade política. Souvenir que é oferecido fartamente nas lojas lá é um relógio com a foto de Trump com a contagem regressiva para o término de seu mandato, o que dá uma ideia de como ele é visto.

O que defende aquele país de imprevisíveis outsiders e seus riscos, como no caso, é a solidez institucional e econômica construída desde sua independência, o que limita muito o potencial de estrago de cada presidente que se sucede. Como aqui, lá o presidencialismo depende do Congresso, que impede aventuras e aventureiros.

Para lembrar, o episódio do ?subprime?, que explodiu em 2008 e gerou a maior crise na economia mundial desde 1929, teve raízes na economia privada e se deu também pelo ?não governo?, na medida em que ocorreu em um sistema financeiro paralelo que operacionalizava a chamada securitização das hipotecas, onde financiamentos eram originados para serem vendidos e sustentaram a bolha imobiliária que vazou; na época, era insuficiente a fiscalização e a regulação deste sistema paralelo, que não respeitou regras e cuidados bancários básicos.

O que vemos no Brasil, mesmo antes dos governos militares, é um amplo avanço do setor público e de sua influência na economia: sempre se vendendo à sociedade uma ideia de que tudo deveria ser suprido pelo Estado, tivemos uma crescente apropriação do PIB pelo setor público e suas corporações; quanto maior a participação governamental na economia, maior será seu potencial de estrago. Diferente das crises americanas, as brasileiras tiveram sempre o DNA público e de seus gestores. Embora, em tese, nosso modelo político se assemelhe àquele, ao também depender de aprovações legislativas, nossa menor qualificação institucional e congressual não consegue nos proteger.

O caos econômico brasileiro atual comprovou nossa fragilidade, pois o arcabouço político-institucional existente não foi capaz de impedir aventuras econômicas e nem a chaga da corrupção, permitindo, entre outros, que a sequência Lula-Dilma colocasse o Brasil em uma situação de desastre inédita e de difícil retorno.

Ricardo Hingel escreve às quartas-feiras, a cada 15 dias. Amanhã, Bruno Zaffari.

terça-feira, 1 de agosto de 2017

POR QUE NINGUÉM BATE PANELA

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ZERO HORA 29 de Julho de 2017


PAULO GERMANO



Estávamos, eu e minha mãe, falando mal do Michel Temer, o café preto fumegando à minha frente e a fatia de pão descansando no pires, então perguntei por que, na opinião dela, as manifestações cessaram depois que Dilma caiu.


A resposta da mãe congelou meu café, deixou a manteiga do pão rançosa e empedrou o bolo de chocolate que repousava no centro da mesa. Ela não disse que o povo cansou. Nem que as pessoas só odeiam o PT. Nem que a indignação arrefeceu, nem que a corrupção importa pouco. Ela disse assim:

? Não me sinto convocada.

Minha mãe não se sente convocada.

Entenderam isso?


Ela quer protestar, mas não tem protestos. Quer se manifestar e gritar e se embrenhar nas multidões, mas ninguém convoca essas multidões. E as multidões estão furiosas, é mentira que o povo cansou, essas multidões indignadas existem e minha mãe faz parte delas, mas, por favor, não vá esperar que uma senhora de 64 anos, sem o menor poder de mobilização, sem sequer saber criar um evento no Facebook, seja catalisadora de multidões. Não será.

Esse catalisador de multidões é o que Elias Canetti chamava de cristal de massa ? uma metáfora que ele buscou na química, sua área de estudo na universidade, para mostrar como as massas se aglutinam. Primeiro: não existe manifestação de massa espontânea. Pode haver um protestinho espontâneo aqui, uma panelinha batendo lá, mas uma manifestação de massa, daquelas gigantescas que ameaçam o status quo e arrepiam a espinha de um presidente, essa aí precisa do cristal de massa. É ele que percebe os anseios, receios, medos e esperanças de indivíduos dispersos ? como a minha mãe ?, depois agrupa esses indivíduos e dá sentido àquela massa.

O último cristal de massa brasileiro foi o MBL, principal organizador das manifestações pelo impeachment de Dilma. Depois que a presidente caiu, líderes do movimento passaram a ocupar cargos públicos, eletivos e comissionados, em uma série de cidades país adentro. Quer dizer: o MBL aderiu ao status quo.

Aqui jaz um cristal de massa.

Que cristal de massa existe hoje pedindo a saída de Temer? PT, CUT, UNE, MST? Essa turma se acostumou de tal forma aos mecanismos de cooptação do governo anterior, que se inviabilizou como representante de massas ? viraram grupos estéreis, incapazes de liderar qualquer convergência de maior proporção. Não temos mais a UNE do Fora Collor, nem o PT das Diretas Já, nem a UDN contra Getúlio, nem o Brizola da Legalidade, nem o Movimento Passe Livre de 2013.

Sem um cristal de massa, qualquer estopim para a rebelião nas ruas, qualquer novo fato que confirme a bandalheira desse governo claudicante não é aproveitado ? não serve de gatilho para a revolta de uma massa, ainda que os indivíduos dispersos, como a minha mãe, estejam sedentos por dizer ?basta?. Nenhum presidente cai sem o clamor das ruas. E nenhum clamor se materializa sem um cristal de massa para conduzi-lo.

Portanto, se alguém aí estiver articulando um protesto contra Michel Temer, que faça logo. Multidões vão apoiar, tenho certeza, só que o tempo é curto. Vamos logo, por favor, minha mãe aguarda aflita.

terça-feira, 25 de julho de 2017

A DEMOCRACIA TOTALITÁRIA



ZERO HORA 25 de julho de 2017 | N° 18906. ARTIGO

DENIS LERRER ROSENFIELD




Lula, a despeito de sua condenação em primeira instância, está dando sucessivas mostras de que não estaria disposto a seguir nenhuma decisão judicial. O seu partido multiplica manifestações com o intuito de criar uma pressão popular que possa, inclusive, redundar em uma crise institucional. Seus advogados nem se preocupam com argumentos jurídicos, mas fazem tão somente o trabalho da repercussão política.

Petistas e simpatizantes estão divulgando a tese de que as urnas deveriam julgar o ex-presidente, como se o arcabouço legal e constitucional do país não valesse. Criminosos, em um regime constitucional, devem ser julgados por tribunais e não por processos eleitorais. Há, nessa tese, uma concepção política embutida, a de que a soberania popular seria ilimitada, sendo, portanto, capaz de julgar, não sofrendo nenhuma delimitação propriamente constitucional. A democracia constitucional, representativa, cessaria de valer quando submetida a uma eleição.

O que o ex-presidente e o PT estão veiculando é uma ideia de democracia totalitária. O termo foi cunhado por um célebre cientista político inglês, J. L. Talmon, em seu livro Origens da Democracia Totalitária. Segundo ele, tratar-se-iam de regimes políticos baseados na ideia da vontade ilimitada do povo, sendo a lei completamente suprimida face ao exercício dessa vontade caracterizada pela ausência de limites. A lei, assim como a Constituição, pelo contrário, cria limitações, colocando travas a qualquer ação política e à atuação institucional dos diferentes poderes. Ela é a base da democracia representativa.

Regimes totalitários tiveram apoio do “povo”, de modo que as Constituições então vigentes naqueles países foram completamente subvertidas. Um exemplo atual é o da Venezuela, que, sob Chávez, seguiu à risca tal concepção, mediante eleições sistemáticas que o alçaram à condição de líder-mor. Graças a essa ilimitação da vontade popular, em diferentes referendos, as instituições representativas foram sendo abolidas. Presenciamos, então, uma subversão da democracia por meios democráticos.

Não esqueçamos que Lula chegou a dizer que a Venezuela tinha excesso de democracia, e não falta. A atual presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann, acaba de oferecer seu apoio ao ditador Maduro. Os resultados estão aí, com aquele país sendo refém de um “presidente” que abdica, mesmo, de processos eleitorais, privilegiando a violência enquanto modo de governo. Devemos aprender com tais declarações e exemplos!

O colunista escreve às terças-feiras neste espaço

Professor de Filosofia

quarta-feira, 7 de junho de 2017

O POLÍTICO DA INSEGURANÇA



A força policial trabalha de forma árdua, mas, não raras vezes, nem sequer tem apoio da sociedade, que deveria aplaudir os que arriscam a vida para nos defender. (Foto: Reprodução)

O SUL 07/06/2017


O "POLÍTICO" DA INSEGURANÇA 


Fabio Steren



Não deveria ser preciso ler um artigo como este para saber da triste realidade da insegurança com a qual somos obrigados a viver todos os dias. Frequentemente ouvimos histórias de amigos e parentes relatando situações de criminalidade que, banalmente, acabaram de viver, e me refiro aos afortunados que ainda têm a oportunidade de contar. O que aconteceu com a nossa Porto Alegre? Como chegamos a esse terrível patamar de insegurança que nos assola e nos situa entre as capitais mais violentas do mundo?

Claro que fica fácil dizer que todos são culpados. Não basta chamar os criminosos de “vítimas da sociedade”; é preciso lembrar que o compromisso e a mobilização deveriam existir entre todos os responsáveis, para que tenhamos uma cidade mais livre e segura. Infelizmente esse sentimento não existe.

A força policial trabalha de forma árdua, mas, não raras vezes, nem sequer tem apoio da sociedade, que deveria aplaudir os que arriscam a vida para nos defender.

Nas leis, os criminosos têm mais direitos do que deveres. A Justiça, muitas vezes, precisa cumprir a legislação sem considerar o que é certo ou errado moralmente. Ora, onde está o nosso direito de ir e vir? Onde está a segurança que garanta nossa liberdade? Por que no Brasil o certo é o inverso?

A falta de compromisso dos governantes está em todos os jornais. Pensam no seu quinhão. Onde estão os 50% dos impostos que deveriam garantir a segurança, a educação e a saúde?

Em vez de tomar as medidas necessárias para combater a criminalidade, temos como resultado a omissão por conta do barulho que os defensores dos criminosos fazem.

E o cidadão de bem, observador das leis? Quem olha por eles?

É preciso esclarecer que no Brasil vivemos uma falsa democracia, e que cada vez mais estamos caminhando para a diminuição das nossas liberdades.

Nas eleições de 2018, voltaremos a ver as mesmas e antigas promessas políticas de combate à insegurança. Mas você aí, se sente livre e seguro?

segunda-feira, 8 de maio de 2017

REFORMA POLÍTICA URGENTE



ZERO HORA 08 de maio de 2017 | N° 18839. ARTIGO



REFORMA URGENTE, POR CLÁUDIO BRITO*



Não vou propor que acelerem as votações e aprovem logo a terrível reforma previdenciária. Muito menos defenderei que agilizem a aprovação da nova proposta de legislação trabalhista. Ambas exigem muito mais debates que os poucos até aqui realizados. São projetos castradores de direitos, mesmo que seus defensores jurem o contrário. Não que não se deva pretender inovação e avanços, mas o visto até aqui é uma calamidade. Então, que se examine muito bem cada dispositivo projetado, para não apresentarem depois um monstrengo ao exame final do Supremo Tribunal Federal.

A reforma para a qual reclamo urgência é a política. Precisamos que tudo esteja aprovado até outubro, um ano antes da próxima eleição, ou de nada adiantará um novo padrão legal para nossos partidos e seus candidatos, a não ser para 2020. Votação em lista? Voto distrital? E quais serão as regras para o financiamento das campanhas? Haverá reeleições possíveis? Cláusulas de barreira ou de desempenho? Fiquei feliz há poucos dias, quando, em meio ao estrépito da Lava-Jato e outras notícias em torno do prende e solta do STF, escapou uma informação de que foram dados alguns passos no rumo de um texto claro e desejável para uma reforma política. Foi constituída uma nova comissão na Câmara Federal, presidida pelo peemedebista Lúcio Vieira Lima, da Bahia, tendo como relator o petista Vicente Cândido, de São Paulo.

Desmentidos os boatos de um adiamento das eleições, dois pontos foram confirmados pelo novo relator: a cláusula de barreira e o fim das coligações proporcionais. Se ficarmos apenas com essas medidas, já teremos avançado muito, pois são providências suficientes para impedir o toma lá dá cá das negociações de cargos, empregos e ataques aos orçamentos em troca de apoios que ajudam a desenhar o quadro horrendo que pretendemos apagar para sempre. Quero crer nisso e defendo a ideia de extrema urgência na mudança que mais faz falta, a que só a reforma política produzirá.


Jornalista 

quinta-feira, 30 de março de 2017

TRIBUNAIS DO FAZ DE CONTA

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ZERO HORA 30 de março de 2017 | N° 18806


EDITORIAIS





Passada a primeira e desagradável impressão de que basta mexer em qualquer órgão público para a corrupção aparecer, a investida da Polícia Federal no Tribunal de Contas e na presidência da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro evidencia uma outra mazela nacional: o aparelhamento político dos órgãos fiscalizadores. Nada pode ser mais eloquente para demonstrar os danos dessa política de compadrio nas instituições do que o fato de cinco dos sete conselheiros do TCE fluminense, incluindo seu presidente, terem sido alvo de prisão temporária. Prova de que, na prática, uma nomeação para esses tribunais, muitas vezes, traz ganhos consideráveis aos contemplados, sob a forma de salários e aposentadorias elevados, entre outras benesses, e apenas prejuízo para a sociedade.

O agravante, como se constata agora é que, além de serem favorecidos com um cargo vitalício de assessoria ao Legislativo, os beneficiados nem sequer cumpriam com suas obrigações mínimas. Entre elas, está a fiscalização das contas do Executivo, que no caso do Rio foram aprovadas mesmo quando os sinais de descontrole já eram evidentes, e de contratos e licitações em relação aos quais faziam vista grossa.

O país só tem razões para se preocupar quando integrantes de algumas de suas instituições deixam de lado o seu papel de fiscal para perseguir vantagens indevidas. No caso dos TCEs, ninguém ignora que, muitas vezes, acabam se transformando em cortes de faz de conta, pois seus membros – com exceção dos auditores de carreira – são pessoas indicadas pelos próprios governantes, na maioria das vezes amigos e correligionários.

Assim, viram órgãos totalmente políticos em vez de técnicos. Diante dessa fiscalização viciada, não há como fazer funcionar regras como a Lei de Responsabilidade Fiscal, que deveria frear gastos descontrolados e desvios dos administradores.




RBS BRASÍLIA | Carolina Bahia


Quando o fiscal é corrupto



O escândalo envolvendo os conselheiros do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro, infelizmente, não surpreende e tudo indica que está longe de ser um fato isolado. Afinal, como seria possível o desvio de recursos públicos em tantas obras, envolvendo o governo do Estado, sem o envolvimento de quem deveria fiscalizar? E a prisão de cinco conselheiros do TCE/RJ, com base na delação de Jonas Lopes, ex-presidente do próprio tribunal, é apenas o começo. Mais cedo ou mais tarde, também esses conselheiros acusados de corrupção vão contar o que sabem, expondo as entranhas das relações espúrias entre a cúpula do TCE, políticos e empresas. Será um mapa do crime, que servirá como modelo para as investigações da Polícia Federal em outros Estados daqui por diante. É uma excelente oportunidade para que o país discuta o critério de escolha dos integrantes dos tribunais. As indicações políticas, assim como os apadrinhamentos, deveriam ser eliminadas. Conselheiro de TCE ou ministro do TCU deveria ser cargo técnico, independente de compromissos partidários. Já seria um bom começo.

terça-feira, 28 de março de 2017

DIÁRIAS DE VEREADORES DO RS EM 2016 TEVE UM CUSTO DE 14 MILHÕES DE REAIS



ZERO HORA - 28 de março de 2017 | N° 18804


GIOVANI GRIZOTTI


POLÍTICA. Gasto com diárias nas Câmaras do RS foi de R$ 14 milhões em 2016

LEVANTAMENTO DO MP DE CONTAS mostra que municípios do Interior tiveram os maiores custos

Conforme levantamento do Ministério Público de Contas (MPC), as Câmaras de Vereadores das 497 cidades gaúchas custaram juntas, no ano passado, mais de R$ 895 milhões aos cofres públicos. Só em diárias, foram R$ 14 milhões, revelou ontem reportagem do RBS Notícias, da RBS TV.

O estudo aponta o ranking de gastos com diárias. O Legislativo de São Gabriel é o campeão. Consumiu R$ 264 mil – um vereador chega a receber um salário mínimo e meio para participar de curso de quatro dias em Porto Alegre. Ao pesquisar no site do Tribunal de Contas do Estado, a reportagem descobriu casos de parlamentares não reeleitos que fizeram cursos depois da eleição de outubro, mesmo sabendo que o mandato terminaria em poucas semanas. Caio Rocha (PP), por exemplo, recebeu R$ 1,4 mil para frequentar um simpósio em novembro na Capital.

– Não sou (candidato) agora (em 2016), mas posso ser na próxima (eleição) – justifica Rocha.

FISCALIZAÇÃO PODE EVITAR DISTORÇÕES

Para o procurador-geral do MPC, Geraldo da Camino, os cidadãos devem acompanhar mais de perto a preparação do orçamento das Câmaras, podendo evitar desembolsos excessivos:

– Esses gastos ocorrem porque a população não se atenta à fiscalização da execução do orçamento. O controle social é o mais importante e o mais legítimo.

O presidente da União dos Vereadores do RS (Uvergs), Silomar Garcia, também afirma que cidadãos não costumam participar das audiências para discutir os gastos:

– Sabemos que existe discrepância, distorção dos valores, mas a comunidade também é culpada. A Lei de Responsabilidade Fiscal prevê audiências públicas para debater a elaboração do orçamento, e a comunidade não comparece.

A fiscalização poderia evitar distorções como a verificada em Triunfo. Com nove vereadores e uma sessão por semana, a Câmara custou R$ 9,7 milhões no ano passado, a maior parte com cargos de confiança (CCs). É mais do que o total de gastos do hospital da cidade, que atendeu no mesmo período quase 29 mil pessoas e corre o risco de fechar por falta de recursos. O presidente da Câmara, Marcelo Wadenphul (PMDB), promete reduzir os dispêndios em 2017:

– A gente pretende devolver em torno de R$ 2 milhões este ano. Já foram devolvidos R$ 300 mil e assinamos a devolução de outros R$ 600 mil.

Hoje, há mais de 40 CCs na Câmara de Triunfo. O próprio presidente não consegue lembrar, com exatidão, quantos assessores tem.

– Se não me falha a memória, acho que são seis. Cinco. Acho que é por aí – afirma Wadenphul.

sábado, 25 de março de 2017

A ARMADILHA DA LISTA FECHADA

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ZERO HORA 25 de março de 2017 | N° 18802



EDITORIAL





O ex-ministro do STF Ayres Britto diz que o modelo de lista fechada é incompatível com a Constituição e equivale a substituir a democracia pela partidocracia.

Adotado por cerca de 30 países no mundo, o modelo eleitoral da escolha por lista fechada, pelo qual os eleitores votam nos partidos políticos em vez de escolherem candidatos avulsos como ocorre atualmente no Brasil, cabendo às legendas predefinir a ordem dos votados, passou a ser defendido com fervor pelos investigados na Lava- Jato. Fora desse contexto, o sistema do voto em lista até faria sentido, para fortalecer e assegurar maior coerência ideológica aos partidos. No momento atual, porém, a proposta de mudança para esse sistema – não por acaso defendida pelos presidentes da Câmara e do Senado – soa como um escancarado movimento de autodefesa de quem teme a investigação. Além disso, o modelo facilitaria a reeleição dos atuais parlamentares, evitando a perda de prerrogativa de foro de alvos da Lava-Jato.

Nesta semana, em entrevista à GloboNews, o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Carlos Ayres Britto desmascarou de vez a manobra capitaneada por lideranças do Congresso. Afirmou que o sistema é incompatível com o modelo constitucional brasileiro e que equivale a substituir a democracia pela partidocracia. O jurista argumenta que o voto previsto pela Constituição é “direto, secreto, universal e periódico”, no candidato e não no partido. Por fim, advertiu que o modelo favorece o chamado “caciquismo” e não se constitui em boa prática.

Há opiniões divergentes respeitáveis sobre o tema, como a do ministro Luís Roberto Barroso, do STF, que prefere a lista fechada ao sistema atual. Ele lembra que o voto nominal também acaba sendo computado para a legenda e pode garantir a eleição indireta de candidatos que o eleitor nem sequer conhece. Na sua visão, o sistema de lista fechada também tornaria menos onerosas as campanhas eleitorais.

O debate é oportuno, pois o país tem urgência em definir regras para a eleição de 2018, que já se avizinha. Mas dois aspectos da realidade têm que ser considerados nesta discussão: a descrença da população nos partidos e nos próprios políticos e a expectativa dos brasileiros de que os envolvidos na corrupção investigada pela Operação Lava-Jato não ficarão impunes. A lista fechada não pode ser utilizada para tornar sem efeito a lista de Janot.

sexta-feira, 24 de março de 2017

ABUSO DE PODER

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ZERO HORA 24 de março de 2017 | N° 18801


DAVID COIMBRA




Há muita gente preocupada com o que chamam de “abuso de poder”, no Brasil. Gente como Renan Calheiros, Sarney, Lula, Dilma, Cunha, Jucá, entre outros. Todos eles, curiosamente, poderosos.

Eu aqui não tenho poder algum, mas também me preocupo com o abuso de poder.

Por exemplo:

O poder de nomear apaniguados para diretorias de grandes empresas estatais e órgãos de fiscalização.

O poder de beneficiar empreiteiras em obras do Estado.

O poder de afastar do caminho fiscais que estejam fazendo o seu serviço corretamente.

O poder de comprar e vender medidas provisórias.

O poder de usar dinheiro do contribuinte para financiar blogs de propaganda política.

O poder de governantes se associarem a empresários para que ambos se locupletem com recursos do Estado.

Isso, de fato, é abuso de poder.

Sempre se abusou do poder no Brasil. Sempre se disse que esses poderosos jamais seriam alcançados pela lei, que eles podiam fazer o que quisessem, que no Brasil valia tudo para quem tinha dinheiro e... poder.

Mas agora é diferente. Agora, os poderosos também estão respondendo pelos seus atos. É a isso, a essa responsabilização, que esses poderosos chamam de “abuso de poder”.

Outros, nem tão poderosos, fazem coro. Também acham que a Polícia Federal, o Ministério Público e a Justiça praticam abuso de poder. Compreensível. A ideia de que todos são iguais diante da lei ainda é chocante no Brasil, um país em que os maiores valores são, precisamente, dinheiro e poder.

Observe como o país reagiu à Operação Carne Fraca. Só o que se fala é nas exportações, nas vendas da carne brasileira. Ou seja: no dinheiro que a carne gera.

E a saúde das milhares, talvez milhões de pessoas que se alimentaram com carne estragada durante tanto tempo?

Nós entrevistamos, no Timeline, o fiscal que fez a denúncia desencadeadora da operação. Entre outras revelações, ele contou que esse escândalo ocorre há mais de 10 anos, que os antigos ministros da Agricultura sabiam do que acontecia e que, em muitos casos, a carne podre ficava mergulhada em produtos químicos por 30 horas para ganhar aparência saudável no supermercado.

Você comeu essa carne. Os seus filhos comeram.

O que pode ter ocorrido com sua saúde e a de seus filhos, com a saúde de multidões de brasileiros que se alimentaram com esse veneno por mais de 10 anos?

Por que ninguém nem sequer especula sobre isso?

Por que só se fala nas exportações e no que as empresas vão perder com as denúncias?

Porque, no Brasil, o dinheiro é mais importante. O poder é mais importante.

Eles têm dinheiro. Eles têm poder. Eles abusaram do poder. E só o que querem é continuar abusando.

terça-feira, 7 de março de 2017

MANDATOS SOB SUSPEIÇÃO

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ZERO HORA 07 de março de 2017 | N° 18786


EDITORIAIS





Depois de ouvir executivos e ex-executivos da Odebrecht sobre as doações irregulares para a última campanha presidencial, o ministro Herman Benjamin, do Tribunal Superior Eleitoral, promete finalizar o relatório que trata da impugnação da chapa Dilma/Temer ainda no primeiro semestre deste ano. As informações vazadas dos depoimentos praticamente desfazem a tese da separação de campanhas e apontam para uso de dinheiro ilícito por ambos os candidatos, o que, em tese, significa perda dos direitos políticos para a ex-presidente Dilma e cassação do mandato do presidente Michel Temer. Mas os recursos possíveis e os prazos legais indicam que o processo não será concluído antes de Temer deixar o cargo, no final de 2018. Neste caso, o processo será extinto.

O relator tem pressa de apresentar seu voto ao plenário do TSE, pois seu mandato termina em outubro deste ano e ele não poderá ser reconduzido. Porém, mesmo que o Tribunal Superior Eleitoral conclua o julgamento em 2017, os acusados poderão recorrer ao Supremo Tribunal Federal. Considerando-se a conhecida sobrecarga da Corte Suprema, dificilmente haverá tempo hábil para o trânsito em julgado até o final de 2018.

Caso todos os trâmites fossem agilizados e houvesse um desfecho antes do final do mandato de Michel Temer, o país se veria diante de uma situação ainda mais complicada: um novo presidente teria que ser eleito em 30 dias, de forma indireta, pelo Congresso Nacional. E muitos dos atuais deputados e senadores, como se sabe, estão sob investigação e seus nomes devem figurar na nova lista do procurador- geral da República, Rodrigo Janot.

O recrudescimento da crise política, motivado pelos recentes depoimentos de agentes da corrupção na Operação Lava-Jato e no TSE, deixa o país em sobressalto exatamente no momento em que a economia dá tênues sinais de recuperação. Por enquanto, é impossível vislumbrar uma saída satisfatória para o imbróglio, mas ninguém pode ter dúvidas de que o país só terá um futuro digno se continuar sendo passado a limpo.


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - TRANSITAR EM JULGADO AS FRAUDES ELEITORAIS COM A MÁXIMA URGÊNCIA É GARANTIR CONFIANÇA NA JUSTIÇA E NA LISURA DAS PRÓXIMAS ELEIÇÕES, IMPEDINDO QUE PARTIDOS E POLÍTICOS CORRUPTOS SE CANDIDATEM E SE MANTENHAM NA VIDA PÚBLICA PARA DRENAR O PAÍS...

domingo, 22 de janeiro de 2017

ESTADOS UNIDOS PRIMEIRO



ZERO HORA 21 de janeiro de 2017 | N° 18748


TRUMP REAFIRMA "EUA PRIMEIRO"



Com um discurso marcado por um forte tom protecionista, o magnata do setor imobiliário Donald Trump prestou juramento ontem como o 45° presidente dos Estados Unidos e anunciou que todas as decisões de Washington serão orientadas a priorizar o país.

– A partir deste dia, uma nova visão governará nossa pátria. A partir deste dia, os Estados Unidos vêm primeiro – disse Trump em seu discurso de 20 minutos.

O altivo ex-astro de reality show sem qualquer experiência política assumiu as rédeas da primeira potência mundial das mãos do democrata Barack Obama.

Trump, que pretende deportar até 4 milhões de migrantes ilegais com ficha criminal e construir um muro nos 3,2 mil quilômetros de fronteira com o México, também enumerou em seu discurso “duas regras simples: compre (produtos) americanos e empregue (funcionários) americanos”. Foi aplaudido várias vezes por milhares de simpatizantes vindos de todo o país.

Antes e depois da cerimônia de posse, centenas de manifestantes anti-Trump entraram em confronto com a polícia no centro de Washington. Eles atiraram projéteis, quebraram vidraças e foram dispersados com bombas de gás lacrimogêneo.

– A cerimônia de hoje (sexta-feira) tem um significado muito especial porque não estamos meramente transferindo o poder de um governo a outro, de um partido a outro. Estamos transferindo o poder de Washington e devolvendo-o a vocês, o povo – disse o septuagenário Trump à multidão.

Ele lamentou que o país “enriqueça as indústrias estrangeiras” e “subsidie exércitos estrangeiros”.

– Defendemos as fronteiras de outros países, enquanto nos negamos a defender as nossas. Devemos proteger nossas fronteiras dos estragos de outros países que fabricam nossos produtos, roubam nossas empresas e destroem nossos empregos – acrescentou o presidente.

Na cerimônia de posse, celebrada nas escadarias em frente ao Capitólio, sede do Congresso americano, também prestou juramento mais cedo o novo vice-presidente, Mike Pence.

A vitória de Trump, que deixou o planeta atônito, está ancorada sobretudo nos votos de uma classe trabalhadora branca que desconfia dos políticos tradicionais e que sente que a globalização a prejudicou, transferindo empregos para outros países.

NA PÁGINA DO EXECUTIVO, AMEAÇA DE RETIRADA DO TPP E DO NAFTA


Em um documento publicado na página da Casa Branca na internet, Trump anunciou que retirará os Estados Unidos da Aliança Transpacífico (TPP, na sigla em inglês, formado por 12 países, como Chile, México e Peru, que respondem por 40% da economia mundial) e que foi assinado em fevereiro, mas ainda não foi ratificado. Também ameaçou abandonar o acordo de livre comércio com o México e o Canadá (Nafta). “Se nossos parceiros se recusarem a uma renegociação que ofereça aos americanos um tratamento justo, então o presidente comunicará a decisão dos Estados Unidos de se retirar do Nafta”, acrescentou o texto.

O México observa o bilionário nova- iorquino com inquietação. Suas políticas já lhe custaram milhões em investimentos empresariais não materializados e poderiam arrastar o país para uma recessão.

O gabinete de Trump é o mais branco e o mais rico em décadas. Tem um único negro e, pela primeira vez em quase 30 anos, nenhum hispânico, o que lhe rendeu fortes críticas da principal minoria do país, com mais de 55 milhões de pessoas (17% da população). A ausência de hispânicos no gabinete não é surpreendente para um presidente que promete tomar medidas duras contra a minoria.

Trump também poderia voltar atrás na aproximação com Havana, impulsionada por Obama, e tudo indica que será mais agressivo com a Venezuela.

Milhares de pessoas se manifestaram pacificamente, mas também houve protestos violentos e confrontos com a polícia. Pouco antes, dezenas de manifestantes, muitos encapuzados e vestidos de preto, atiraram pedras, quebraram vitrines de várias lojas, incluindo uma cafeteria Starbucks, uma agência do Bank of America e uma limusine. “Não às deportações, não à Ku Klux Klan, não aos Estados Unidos fascistas!”, repetiam. EM TOM FORTEMENTE PROTECIONISTA, o 45º presidente americano tomou posse com a promessa de transferir o poder de Washington para vocês, o povo e de empregos

Washington


+ ECONOMIA | Marta Sfredo

RISCO TRUMP OUTRA VEZ EM ELEVAÇÃO

Pelas reações dos mercados, ainda havia muitos otimistas. Desde a surpreendente eleição de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos, mantinha-se a interrogação: quem assumiria a Casa Branca seria o mesmo candidato de frases abertamente xenófobas, manifestamente protecionistas? Em seu discurso da posse, ele fez questão de responder que sim.

Se o primeiro discurso após a vitória havia reforçado a esperança de quem esperava o arquivamento das teses agressivas, o da posse reavivou os temores de quem vê no poder um Trump igual ao que percorreu os EUA com suas palavras segregadoras. Durante a fala, houve deslizes em todos os principais índices de bolsas de valores do planeta. Os de Nova York, que andavam animados com as perspectivas de estímulo à economia, não caíram, mas encurtaram os ganhos.

Como o pronunciamento foi pesado no tom mas não trouxe medidas concretas, o desânimo foi temporário. O que se projeta para os próximos dias – há expectativa de medidas de curto prazo, especialmente para mudar deliberações do governo Obama –, é muita volatilidade: altas se não houver novidade, baixas acompanhando “trumpices”. É provável que seu primeiro alvo, como ele tem avisado, seja o programa de saúde apelidado de Obamacare. Mas estão na economia alguma das principais preocupações e, portanto, ações do novo presidente.

Para poupar os leitores apenas de adjetivos autorais, a coluna recolheu algumas reações, no Twitter – para se beneficiar da concisão –, de economistas, historiadores e filósofos que escolheram viver nos EUA, assim como o avô alemão de Trump há mais de um século. Nouriel Roubini, espécie de fruto da globalização, com origens israelense, iraniana, turca e italiana, que se tornou famoso ao “prever” a crise de 2008, caracterizou assim: “raivoso, populista, nacionalista, unilateralista, depressivo, insultante, mau, sem meios-tons, intolerante, arrogante”. O filósofo descendente de japoneses Francis Fukuyama, considerado ideólogo do governo Reagan e autor da tese do “fim da história” – o que incluía a vitória final do capitalismo liberal: Trump só falou para um fatia específica dos EUA, não para todos nós”.

Uma das frases de Trump mais espantosas – não por acaso, virou manchete do site do The New York Times – foi “this american carnage stops right here” (essa carnificina americana para aqui). Jornalistas americanos compararam a frase com a famosa citação de John Kennedy “não pergunte o que a América pode fazer por você, pergunte o que você pode fazer pela América”, que se tornou um clássico. Não houve trechos edificantes no pronunciamento. Apenas uma coleção de ameaças, bravatas e palavras duras. Não foi à toa que colheu protestos violentos nas ruas. O risco Trump voltou a subir.


MAL DONALD TRUMP CHEGOU AO SALÃO OVAL, MANDOU MUDAR O SITE DA CASA BRANCA. SUMIRAM DE LÁ, POR EXEMPLO, AS SEÇÕES DEDICADAS AOS DIREITOS LGBT E ÀS MEDIDAS PARA CONTENÇÃO DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS.

DEMAGOGIA

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ZERO HORA 21 de janeiro de 2017 | N° 18748. PROA


FRANCISCO MARSHALL


Na Guerra do Peloponeso, Tucídides distingue alegações apresentadas por Atenas e Esparta para iniciar o conflito e analisa suas causas reais. No plano diplomático, descreve a ambição imperial de Atenas e a contrariedade de Esparta, mas o melhor de suas análises está no plano interno de Atenas, quando examina os processos decisórios que levaram esta pólis à dupla catástrofe, guerra e derrota. Neste passo, o historiador age como sociólogo, antropólogo e cientista político, examinando como agem os homens em certas condições e o que podemos aprender para evitar erros no futuro. Admirador de Péricles, Tucídides induz o leitor a crer que foi a morte deste (no segundo ano da guerra que duraria 27 anos, de 431 a 404 a.C.) e o consequente triunfo da demagogia em Atenas a causa da derrocada. Analisa, então, o líder Cléon e sua relação com a massa (demos) na assembleia ateniense (a eclésia); é o primeiro estudo sobre a demagogia, apresentada em caráter negativo, como parte da insensatez que pode ameaçar a democracia. A palavra-chave é manipulação: o demagogo manipulando as massas, estas jogando com a ambição de poder do líder.

É este caráter negativo que predomina na cultura política contemporânea, em que demagogia e demagogo são adjetivos de ataque, sobretudo aos líderes populistas, de enorme expressão na América Latina do século XX. Ocorre que há, paradoxalmente, um aspecto positivo na demagogia clássica: a interpretação da vontade popular e a produção de políticas que a atendam. A demagogia pode ser uma forma de comunicação entre o povo e o poder, e permite que se amplie a legitimidade política e a realização de programas cujo beneficiário é o povo. Foi assim com a ação dos líderes populistas no Brasil, responsáveis por modernizações importantes, no rumo de uma sociedade burguesa com classe média proficiente, projeto ainda inconcluso.

Entre as figuras negativas da demagogia, estão o uso perdulário dos recursos públicos para adular o povo, a apresentação do líder vestido em imaginário heroico e a substituição da ação pela propaganda. O líder quer ser visto como providente, e comemora inaugurações e entregas de ambulâncias, mesmo que estas sejam a realização de sua obrigação. O demagogo não tem pudor de dizer que é o cara e que uma nova era se inicia, nem deixa de se apropriar de frases de efeito, mesmo que não as compreenda ou pratique. A desconexão entre ação e propaganda permite que um político hostil ao ambiente se apresente como campeão da sustentabilidade, que um promotor do atraso se diga homem do progresso, ou que pose de sambista faceiro quem trata da morte do samba.

Foi o poder da imprensa e da propaganda que produziu a mutação decisiva da demagogia na sociedade de massas, desde o início do século XX. Sem contato com o povo, o político (com o vilão marqueteiro) formula imagens e as justifica como populares. A dinâmica histórica fica opaca, sem fluxo e refluxo entre povo e lideranças, pois a vontade popular passa a ser tutelada, induzida por mensagens que levam o povo a apoiar candidatos, governantes e medidas que o prejudicam. Assim o povo torna-se refém de uma vontade exótica, e é conduzido a um destino alienado. Para piorar, cada vez mais as pesquisas de opinião balizam a política, intensificando o efeito da máquina de propaganda que hoje move opinião pública e poder. Bons tempos os da demagogia clássica, pois a demagogia atual, midiática, é mais uma fonte da crise política. E sobrevive a pergunta: o que é e como interpretar a vontade popular? Ainda existe povo no mundo atual?

ARQUEÓLOGO E PROFESSOR DA UFRGS