VOTO ZERO significa não votar em fichas-sujas; omissos; corruptos; corruptores; farristas com dinheiro público; demagogos; dissimulados; ímprobos; gazeteiros; submissos às lideranças; vendedores de votos; corporativistas; nepotistas; benevolentes com as ilicitudes; condescendentes com a bandidagem; promotores da insegurança jurídica e coniventes com o descalabro da justiça criminal, que desvalorizam os policiais, aceitam a morosidade da justiça, criam leis permissivas; enfraquecem as leis e a justiça, traem seus eleitores; não representam o povo e se lixam para a população.

domingo, 27 de novembro de 2016

REPÚBLICA DO RABO PRESO

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ZERO HORA 6 de novembro de 2016 | N° 18699


OUTRA VISÃO


ASTOR WARTCHOW*



Hoje é a Câmara dos Deputados e o Senado Federal. Ontem foi o Fiat Elba, o dinheiro nas cuecas, a Petrobras, os fundos de pensão e muitos etceteras. A sucessão de escândalos permite três óbvias constatações que agravam nosso pessimismo. São apenas a ponta de um imenso iceberg denominado Estado brasileiro, um gigante fora de controle público. Afinal, predomina o império do “jeitinho” e da omissão, não havendo consequências administrativas e penais.

O espírito e ânimo do saque ao dinheiro público é uma epidemia nacional. Emprego de parentes, compadrio, favorecimentos e manipulação licitatória são comuns em todas as esferas da administração pública. Aliás, essas constatações me fazem lembrar de um comentário (dos eleitores) que muito ouvi ao longo das inúmeras campanhas eleitorais de que participei.

Em tempos de ditadura e abertura democrática, empenhados e otimistas na renovação político-partidária, éramos surpreendidos. Muitos cidadãos diziam: “É tudo igual mesmo. Melhor deixar o cachorro gordo no poder do que colocar um magro. Vai custar caro engordar outro!”

Ouvia triste e a contragosto porque não concordava. Como não concordo até hoje. Mas, no olhar e sentir de muitas pessoas do povo, a sucessão e a renovação político-partidária é uma simples troca de cachorros. Cachorros atrás do osso!

Voltando no tempo e na história, à época da colonização, e depois do fracasso das capitanias hereditárias, o governo português inventou os governadores-gerais. E com eles, a burocracia. Há registros históricos sobre o desembarque de nobres, funcionários públicos, soldados e criminosos (réus e degredados). Aliás, quase todos solteiros e interessados em grana fácil. Resultou uma estrutura estatal forte, organizada, centralizadora e burocrática. Que não encontrou resistência civil. Consequentemente, nossa sociedade de então se adaptou a essa estrutura estatal.

Trata-se do domínio de uma casta de altos funcionários aliada ao patronato político cujos interesses comuns formam uma associação parasitária. Juntos compõem uma rede que, espalhada pelo país, extrai dele tudo o que pode. Leia mais em Os donos do poder (1958), do gaúcho Raimundo Faoro (1925-2003).

O fruto principal dessa deformação histórica e dessa adaptação da sociedade é o “jeitinho brasileiro” e o famoso “querer levar vantagem em tudo”. Repito: nepotismo, compadrio, fraudes, falsificações, desrespeito a contratos, entre outros exemplos, são ações e atitudes que não sofrem reprovação moral. Ou então, quando descobertos, “não dá nada!”

De modo que o espírito do saque e o ânimo dominante confirmam a máxima de Aparício Torelly, o popular Barão de Itararé: “Negociata é um bom negócio para o qual não fomos convidados!”

Em verdade, estamos a merecer, como povo e sociedade, um apurado estudo de caráter sociológico sobre nosso caráter e nossa natureza (a)ética. Ou tudo será, simplesmente, falta de educação, repressão, punição e cadeia?

*Advogado

sábado, 19 de novembro de 2016

A SÍNTESE DO DESESPERO DOS POLÍTICOS ENLAMEADOS


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ZERO HORA 19 de novembro de 2016 | N° 18692




HUMBERTO TREZZI


A noite de quinta-feira terminou com imagens fortes. Desesperado ao saber que teria mesmo de passar uma temporada atrás das grades do temido complexo penitenciário de Bangu, o ex-governador fluminense Anthony Garotinho (PR) grita, esperneia, ameaça fugir. Tenta escapar da ambulância, mesmo de camisolão reservado aos pacientes (quando foi preso, na quarta-feira, alegou doença cardíaca e pediu para ser submetido a tratamento coronariano). O juiz não se comoveu e Garotinho foi mesmo para o presídio, ante gritos de protesto de sua filha.

Cobri para Zero Hora a eleição de Garotinho como governador do Rio em 1998. Ex-comunista na juventude, ele estava brizolista na época em que chegou ao governo fluminense. Passaria depois pelo PMDB e finalmente desembocaria no PR, onde está até hoje, numa encarnação da volubilidade ideológica dos políticos brasileiros. Impressionava sua postura, entre triunfante e debochada, ante qualquer pergunta.

Tinha resposta para todos os problemas do Rio – e conseguiu convencer a população, tanto que emplacou a mulher, Rosinha, como sucessora no governo (eleita em primeiro turno).

Que contraste entre o Garotinho daqueles anos e o homem grisalho que luta para fugir da prisão, filmado na quinta-feira... O segredo por trás dessa mudança atende pelo nome de foro especial (ou privilegiado). Garotinho perdeu essa condição ao não se eleger para cargo político. Foi para a prisão. O mesmo aconteceu, um dia depois, com seu adversário político e também ex-governador (e ex-aliado) Sérgio Cabral (PMDB).

Até pouco tempo atrás, políticos importantes no Brasil tinham direito aos salamaleques reservados para autoridades, na base do ditado “quem é rei não perde a majestade”. Não mais, a se julgar pelos presos da Lava-Jato e outras operações anticorrupção lideradas por policiais federais e procuradores. Garotinho perdeu não só a majestade, mas a altivez e o ar jovial que combinavam com o apelido. É apenas mais um entre os ex-políticos encarcerados – basta lembrar José Dirceu (PT), Eduardo Cunha (PMDB), Antonio Palocci (PT), João Cláudio Genu (ex-tesoureiro do PP), entre outros.

É por isso que muito parlamentar enlameado teme um castigo nas urnas em 2018. Podem se tornar os próximos ocupantes do cárcere.

ESTAMOS EM GUERRA!



ZERO HORA 19 de novembro de 2016 | N° 18692


OUTRA VISÃO | FERNANDO PITREZ




A afirmação que intitula este texto, embora aparentemente surrealista, é real e reconhecida pela maioria da sociedade, cônscia de suas prerrogativas e deveres. Nos dias atuais, estamos em uma verdadeira batalha sem tréguas contra políticos que, por dever constitucional e de própria consciência, teriam por obrigação preservar os interesses populares e preservar a honradez de seu encargo. As reclamações das redes sociais refletem a insatisfação e o repúdio do povo contra ações delituosas.

Nossa pátria amada está sendo saqueada por políticos inescrupulosos, preocupados muito mais em preservar seus próprios interesses e livrar-se dos ditames da lei. O triste espetáculo da famigerada Lava-Jato, cujas consequências são imprevisíveis, corrobora essa assertiva. As inescrupulosas artimanhas em curso, maquiavelicamente engendradas para anistiar o inaceitável delito do dito caixa 2, são um outro lustroso exemplo desta distorção. O escândalo da rapina da Petrobras por agentes inescrupulosos, a PEC 241, resultado de conchavos partidários condenáveis, são exemplos deploráveis da falta de mínimo respeito ao decoro parlamentar.

Este espaço restrito não me permite abordar outros tantos malfeitos, como diria a nossa ex-presidente. A hipocrisia, considerada um pecado moral, é virtude na prática parlamentar. Shakespeare, inclusive, já havia proclamado que “a política está acima da consciência”, o que é uma verdade inquestionável.

Os cidadãos passam com justa razão a repudiar a corrupção generalizada, exaustos de apreciar diuturnamente as acusações expostas pela mídia atuante. Passam então a exigir o cumprimento formal dos eleitos de sua preferência, as responsabilidades por eles assumidas antes do pleito. Não bastam mais meras promessas falaciosas, faz-se mister cumpri-las.

Inclusive, diante desses fatos, têm-se a impressão de que perderam completamente o senso de decência e de sua responsabilidade, passando a considerar a percepção coletiva como um rebanho de dóceis ovelhinhas.

É por esses e outro motivos que considero que “estamos em guerra” contra os políticos.

sábado, 5 de novembro de 2016

BRANCOS E NULOS, AS CONSEQUENCIAS PARA A DEMOCRACIA



Aumento dos votos nulos, brancos e abstenções é um recado que os políticos precisarão levar a sério: os eleitores clamam por mudanças mais profundas do que trocas de nomes em gabinetes

Por: Letícia Duarte
ZERO HORA 04/11/2016 - 14h02min 


Foto: Edu Oliveira / Agência RBS


O segundo turno da eleição deste ano definiu os novos governantes de 57 municípios do país, mas o grande vencedor ficou de fora desta lista. Correndo por fora dos palanques, o "não voto" bateu recorde e acabou eleito como melhor opção por 10,7 milhões de brasileiros – o que representa 32,5% do eleitorado que votou no último domingo. É o maior percentual de abstenções, brancos e nulos já contabilizado em um segundo turno desde que o Tribunal Superior Eleitoral passou a divulgar estatísticas digitalizadas, em 2004. Tanto que, em Porto Alegre, essa opção angariou 30 mil votos a mais do que os recebidos pelo futuro prefeito Nelson Marchezan Jr. (PSDB). E o fenômeno se repetiu país afora. No Rio, 41% do eleitorado não participou da escolha que resultou na vitória de Marcelo Crivella (PRB), maior patamar entre as Capitais.


Associado a um desencanto com a política, o fenômeno segue uma curva ascendente. No segundo turno de 2012, por exemplo, o total de abstenções, brancos e nulos foi de 26,5%, quase seis pontos percentuais menor do que o atual. Ainda que haja discussão sobre o número real de abstenções, já que em cidades onde houve recadastramento biométrico o índice diminuiu, o crescimento é considerado expressivo por especialistas. Se levados em conta apenas os votos brancos e nulos, o salto foi de 9,2%, no segundo turno de 2012, para 14,3% dos eleitores no domingo passado. Mas que consequências essa opção (ou a falta dela) traz? Se um dos pilares do sistema democrático é o voto, a progressiva recusa dos eleitores em participar dessa escolha poderia colocar em risco a própria democracia? Estamos vivendo um momento singular ou uma escalada consistente?

Analistas ouvidos pelo caderno DOC avaliam que, ao menos por enquanto, a democracia vai bem, obrigada. Não estaria ameaçada enquanto sistema. Mas alertam: a mensagem das urnas precisa ser ouvida pelos partidos. Porque é eloquente. E clama por mudanças reais, não apenas troca de jingles, siglas e rostos nos gabinetes. É uma ausência que grita.

– É um sinal amarelo muito forte, quase vermelho, porque a descrença está muito grande – avalia o advogado e pesquisador na área de política e judiciário Lincoln Noronha, doutorando em ciência política pela USP.

João Dória (acima) em São Paulo e Alexandre Kalil (abaixo) em Belo Horizonte: eleitos que vendem a imagem de homens ¿fora da política¿Foto: MARCELO GONCALVES / SIGMAPRESS/ESTADÃO CONTEÚDO


Foto: UARLEN VALéRIO / O TEMPO/ESTADÃO CONTEÚDO

Na sua avaliação, a deserção dos eleitores estaria relacionada a dois fatores principais: de um lado, a desconfiança da classe política, arrebatada pelos escândalos recentes escancarados pela Operação Lava-Jato. De outro, disputas locais marcadas por conjunturas menos acirradas – seja por previsibilidade do resultado, seja pelo fato de os eleitores não se sentirem representados por nenhuma das candidaturas.

– Quando a disputa está mais acirrada, as pessoas sentem que o voto delas pode fazer a diferença, o que em muitos lugares não aconteceu, e isso reduz a participação – observa Noronha.

Em um estudo que examinou os resultados desde 1985 até 2016 das eleições a prefeito em Curitiba, o professor Emerson Cervi, do programa de pós-graduação em Ciência Política da Universidade Federal do Paraná (UFPR), obteve uma amostra mais precisa do fenômeno. Ao calcular quantos votos válidos havia em cada eleição com relação a cada não voto, para medir um indicador chamado razão de voto válido, constatou que a legitimidade desta eleição é a menor da série histórica.

– A ideia desse índice não é olhar partido ou quem ganha, mas quanto há de participação para legitimar o eleito. Se tiver uma razão de 10 votos válidos para cada não voto, por exemplo, significaria que o eleito teve uma grande legitimidade. Se tiver uma razão de um voto válido para cada não voto, ainda que o candidato tenha feito 90% dos votos, ele não estaria legitimado, porque muita gente não participou – explica.

O resultado mostra que, nesta eleição em Curitiba, que elegeu Rafael Greca (PMN), houve a menor razão de votos válidos desde a redemocratização, tanto no primeiro quanto no segundo turno. No primeiro, a razão foi de 2,6. No domingo, caiu para 2,1.

– Até então, a nota mais baixa tinha sido a de 1992 (2,8), após o impeachment do Collor. E o interessante é que naquela eleição e nesta foi o mesmo prefeito eleito, o Greca. Ele é o cara que vem depois do tsunami – compara.

Para o professor, essa tendência de deslegitimação eleitoral está relacionada a um processo de "criminalização da política", que teria se acentuado nos últimos anos, na esteira de operações como a Lava-Jato e da cobertura midiática dos escândalos.

– Mesmo que se tente criminalizar um partido, para o eleitor a crise é geral, e isso o afasta. Quem perde são todos os integrantes da elite política, todos os partidos e os prefeitos eleitos. Não diria que é uma ameaça ao sistema democrático, mas é um problema para os líderes partidários e novos representantes, que vão ter mandatos mais frágeis. Não me parece que a democracia esteja em jogo, mas há quase uma posição deliberada de enfraquecimento da representação política e de fortalecimento de outras formas de representação, em especial por agentes burocráticos do Estado – interpreta o cientista político.

Ainda assim, Cervi não acredita que o não voto seja uma tendência irrefreável.

– São ciclos políticos que a gente tem que passar. Estamos no final de um ciclo, que coincidiu com a Lava-Jato, aumentou a rejeição do brasileiro em relação à política e o medo dos políticos de irem para cadeia. Isso fez com que todo o sistema político se desestabilizasse – salienta.

Na visão da professora Vera Chaia, do departamento de Política da PUCSP, a recusa dos eleitores em participar das urnas tem um viés positivo. Diante de um sistema adoecido por escândalos e negociatas, a massa insatisfeita mostra que não será conivente em respaldá-lo.

– Do ponto de vista da democracia é altamente salutar, porque mostra que muita coisa tem que mudar, senão vai ficar na mesma. O eleitor quer mudança, quer votar em quem ele confia, em quem tem proposta, não porque é obrigado a votar. Isso mostra aos políticos, à democracia, que são necessárias mudanças no sistema eleitoral, partidário, e com isso fica aberta a possibilidade de alteração no sistema para ampliar a confiança no eleitor – avalia.

Os críticos desse comportamento eleitoral costumam argumentar que quem se omite acaba governado pelos que se posicionam. Mas, segundo Vera, esse discurso tem pouco efeito sobre os que optam pelo não voto porque, na visão deles, não há verdadeira escolha.

– Nada vai mudar do ponto de vista deste eleitor, ele está se negando a participar desse processo, e isso tem de ser respeitado – opina.

Entre as mudanças que precisam ser discutidas para o aperfeiçoamento do sistema, a cientista política considera que seria saudável incluir a opção pelo voto facultativo, sistema em vigor em democracias maduras como os Estados Unidos e países europeus. No Reino Unido, por exemplo, 34% dos eleitores se abstiveram de votar nas eleições de 2015, que reconduziram David Cameron a um mandato de cinco anos após seu partido conquistar maioria no Parlamento. Uma das vantagens do voto facultativo, avalia a professora da PUCSP, seria que os partidos teriam de convencer o eleitor a votar – e apresentar propostas políticas consistentes.

– Hoje o eleitor vota sem vontade, é obrigado, e muitos se negaram a votar, porque não veem sentido, nada muda. É um recado muito claro do eleitor em relação ao nosso sistema político. Tivemos o impeachment, mas isso não significou mudança no sistema. O presidente atual continua a mesma prática política, com os mesmos vícios de distribuição de cargos, e o eleitor sabe o que está acontecendo, vê que não ocorreram mudanças fundamentais. A resposta do eleitor é negar a política e o processo eleitoral – diagnostica.

Para o sociólogo José Maurício Domingues, professor do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Uerj e pesquisador associado do Centro de Estudos Estratégicos da Fiocruz, é preciso compreender a lição dessa ausência.

– Mesmo que falem que as abstenções tenham a ver com o recadastramento eleitoral, não creio que seja por isso. A gente vem vendo um crescimento desses votos, e nesta eleição isso ficou particularmente acentuado. Não é por acaso que as pessoas pararam de votar, ou estão votando branco e nulo. As pessoas não estão vendo que a democracia está realmente próxima a elas, servindo para os projetos em que as pessoas se colocam por direito, por participação. Não é só que não tem um candidato para votar, é uma desilusão mais profunda. Houve um desencanto com o que a política significa – reflete.

Neste divã eleitoral, os ecos do desencanto ainda são imprecisos. Autor do livro O Brasil entre o presente e o futuro (Mauad, 2015), Domingues considera cedo para prever o que vai acontecer nas eleições de 2018.

– O sistema político deve estar ainda mais desestruturado, mas é uma eleição que conta muito. Não dá para fazer uma projeção simplista, porque a disputa presidencial é sempre uma coisa que mobiliza muito o eleitor, bota em questão o conjunto de sua vida – pondera.

Se, por um lado, há uma tendência de consolidação de forças mais conservadoras em curso, por outro, o cenário ainda deve ser bastante impactado pelos desdobramentos da Operação Lava-Jato. Quem serão os próximos atingidos? A resposta será crucial para determinar a nova correlação de forças.

– Para o PSDB foi bom num primeiro momento, mas tem que ver o que vai acontecer: se Serra, Aécio e Alckmin forem realmente atingidos por denúncias mais graves, também o PSDB pode acabar numa situação delicada. A esquerda está muito destruída, vai ter que se reinventar, e temos um centro mais moderno e democrático, que a Marina e a Rede poderiam representar, mas que está com muita dificuldade de emergir. Para o eleitor, está tudo meio esquisito. A esquerda ficou com uma cara ruim, mas não é uma coisa definitiva. Isso pode ser revertido – diz.



Porto Alegre teve mais brancos, nulos e abstenções do que votos em Marchezan


De cada quatro eleitores, um não compareceu às urnas, sete pontos percentuais a mais do que o registrado em 2012


Por: Itamar Melo
ZERO HORA 30/10/2016 - 21h59min


Nelson Marchezan Júnior teve 402 mil eleitores, menos do que a soma dos que não votaram em ninguém na CapitalFoto: Mateus Bruxel / Agencia RBS


Em Porto Alegre, 402 mil eleitores escolheram Nelson Marchezan Júnior e 262 mil optaram por Sebastião Melo, mas o maior contingente preferiu mesmo não ficar com nenhum dos dois. A soma de abstenções, brancos e nulos passou de 433 mil — 30 mil pessoas a mais do que as que elegeram prefeito o candidato do PSDB.

Em comparação com eleições anteriores, foi uma disparada histórica na proporção dos que não votaram em nenhuma das duas opções disponíveis. Uma em cada quatro pessoas habilitadas (25,2%) sequer compareceu à seção eleitoral, sete pontos percentuais acima do registrado no primeiro turno de 2012 e praticamente o dobro dos ausentes em 2000. Foram 277 mil abstenções — mais do que o número de votos do atual vice-prefeito, Sebastião Melo.

Para cientistas políticos, os dados sugerem que uma grande fatia dos porto-alegrenses não se sentiu representada nesse segundo turno.

— Pode-se dizer que eram dois projetos muito iguais. Isso cria a ideia do "tanto faz". A abstenção e os votos branco e nulo têm a ver com a indiferenciação dos candidatos, em termos de projetos. Isso retira muito da legitimidade da eleição — afirma a cientista política Mercedes Cánepa, professora aposentada da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).



O professor da UFRGS Gustavo Grohmann relaciona os resultados ao fato de parcela expressiva da população não se sentir contemplada pelas opções existentes, mas relativiza a importância do índice elevado de abstenções. Segundo ele, as ausências podem ser explicadas em parte por problemas no cadastro eleitoral. Ele considera mais relevante analisar os brancos e nulos. E, nesse particular, a eleição de domingo trouxe números alarmantes.


O índice dos que se deram ao trabalho de comparecer diante da urna e não selecionar nenhum dos dois candidatos foi o maior desde 2000. Os nulos representaram 13,36% (109 mil pessoas), contra 4,83% na eleição anterior. Os brancos pularam de 4,57% para 5,67% (46 mil).

— O resultado não chega a ponto de retirar a legitimidade do pleito, mas cabe investigar qual a natureza da insatisfação do eleitorado — avalia Grohmann.

Uma das expectativas da votação tinha relação com a proporção dos votos nulos. Com a exclusão de candidatos da esquerda da disputa, os eleitores desse campo passaram as últimas semanas em um debate ferrenho sobre como se comportar diante da urna. Uma parte defendia com fervor a anulação do voto, por considerar Melo e Marchezan igualmente intragáveis. Um outro grupo estridente propunha votar no atual vice-prefeito, por considerar o candidato tucano mais ameaçador. No fim das contas, tudo indica que os votos dos partidários de Luciana Genro (PSOL) e Raul Pont (PT) se pulverizaram.

O voto nulo avançou, mas não de forma tão acentuada: cresceu de 8,88% para 13,36% do primeiro para o segundo turno. Melo também cresceu, mas não arregimentou uma quantidade avassaladora dos votos da esquerda — ganhou cerca de 80 mil votantes extras no segundo turno, enquanto os dois candidatos de esquerda tiveram 215 mil eleitores em 2 de outubro. Para comparar, Marchezan avançou em 190 mil votos.

— Os números apontam que a esquerda se dividiu, uma divisão que já aparecia com muita clareza nas discussões — diz Mercedes Cánepa.



Indiferença — ou protesto — também se repetiu no resto do país

Porto Alegre teve uma quantidade histórica de nulos, brancos e abstenções, mas não foi um caso isolado no país. O segundo turno foi marcado pela indiferença ou o protesto dos eleitores em outras metrópoles importantes.

No Rio de Janeiro, os índices foram superiores aos da capital gaúcha. Os votos em branco ficaram ligeiramente abaixo (4,85% contra 5,67%), mas os cariocas optaram com muito mais avidez pela anulação ou a abstenção. Deixaram de comparecer à urna, na Cidade Maravilhosa, 26,85% dos eleitores. Os nulos foram 15,90%. No total, mais de 2 milhões de habilitados a votar não escolheram nenhum dos candidatos — 300 mil a mais do que a votação do vencedor, Marcelo Crivella (PRB).

Se em Porto Alegre os números são explicados pela parecença entre as opções, no Rio a situação era oposta. Os candidatos não podiam ser mais diferentes. Crivella é um bispo licenciado da Igreja Universal, de perfil ultraconservador. Seu oponente, Marcelo Freixo (PSOL), vem da esquerda radical. Entre um e outro, muitos eleitores de centro preferiram nenhum dos dois. Não se sentiram representados.

Em maior ou menor grau, o fenômeno repetiu-se em outras capitais, como Belo Horizonte (MG) e Curitiba (PR), que tiveram campanhas marcadas pela virulência. Na cidade paranaense, houve 20,12% de abstenções e 11,45% de nulos. Na metrópole mineira, os índices foram de 22,77% e 15,55%. Somando-se os votos brancos, também em Belo Horizonte o eleito, Alexandre Kalil (PHS), foi superado por larga margem pelos que não votaram em ninguém.

Segundo a cientista política Mercedes Cánepa, esse quadro tem a ver com o momento político e econômico do país.

— Essa é uma eleição muito difícil de avaliar, porque o processo está desfigurado por ocorrer durante uma recessão e em um momento de exceção, de um impeachment tido por muitos como golpe de Estado.

terça-feira, 1 de novembro de 2016

O VOTO EM NINGUÉM

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ZERO HORA 01 de novembro de 2016 | N° 18675



EDITORIAL




Somados, os eleitores que não votaram, os que votaram em branco e os que anularam o voto tinham força política para eleger qualquer candidato no pleito municipal concluído no último domingo. Na maioria das capitais e cidades que tiveram um segundo turno eleitoral, os votos em ninguém foram mais numerosos do que os apurados para os candidatos eleitos. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral, 10,7 milhões de pessoas optaram por não chancelar a escolha dos candidatos que governarão seus municípios pelos próximos quatro anos. As razões são variadas, mas convergem para uma evidência inequívoca: o desencanto dos cidadãos com a classe política.

Evidentemente, muitos desencantados também votaram, talvez mais por acreditar na democracia representativa do que propriamente nos partidos políticos e nos postulantes a cargos públicos. Mas o contingente de não votantes, somado aos eleitores que foram às urnas e renunciaram à escolha, assumiu proporções estarrecedoras. E deixou uma silenciosa, mas eloquente, mensagem de rejeição aos políticos.

Motivos para isso não faltam: os escândalos de corrupção, a Lava-Jato, os conluios pelo poder, a frágil identi- dade programática dos partidos, as negociatas e a pouca eficiência das administrações públicas, que arrecadam muito, gastam demais e dão retorno insuficiente aos cidadãos. Até mesmo na escolha dos novos prefeitos essa insatisfação ficou clara, pois prevaleceram o discurso apolítico e a opção pelo novo.

Vitoriosos e derrotados, portanto, têm um mesmo desafio: recuperar a confiança da população. Cabe debater prioritariamente, neste momento, como os eleitos superarão a descrença e governarão com legitimidade, sem ter apoio da maioria de suas populações. O voto em ninguém não pode ser interpretado apenas como manifestação de ressentimento das correntes que não tinham candidatos. É mais do que isso: é um clamor do país por mudança no modo de se fazer política.

O que não se pode ignorar é que esse voto de desapontamento não deixa de ser um voto pelo Brasil. Ao manifestar com clareza sua frustração, os eleitores estão exigindo novas posturas, ideias mais arejadas, comprometimento com a ética e com o interesse público. Com mais legitimidade ainda, é o que também devem exigir os brasileiros que votaram e elegeram seus candidatos, pois o exercício da cidadania não se esgota no processo eleitoral. Se o voto em ninguém é um alerta, o voto consciente e endereçado é uma credencial irrenunciável de participação.


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - NESTAS ELEIÇÕES MUNICIPAIS, OS VENCEDORES NÃO REPRESENTAM O POVO. SINAL DE DESENCANTO E DESCONFIANÇA NOS POLÍTICOS, NOS PARTIDOS, NOS GOVERNANTES E NOS REPRESENTANTES LEGISLATIVOS. O povo brasileiro está exigindo punição e banimento dos políticos e partidos corruptos e uma ampla e contundente reforma capaz de resgatar a confiança nos governantes, nos legisladores e nos fiscais.