VOTO ZERO significa não votar em fichas-sujas; omissos; corruptos; corruptores; farristas com dinheiro público; demagogos; dissimulados; ímprobos; gazeteiros; submissos às lideranças; vendedores de votos; corporativistas; nepotistas; benevolentes com as ilicitudes; condescendentes com a bandidagem; promotores da insegurança jurídica e coniventes com o descalabro da justiça criminal, que desvalorizam os policiais, aceitam a morosidade da justiça, criam leis permissivas; enfraquecem as leis e a justiça, traem seus eleitores; não representam o povo e se lixam para a população.

sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

CRÔNICA DE UMA MORTE ANÚNCIADA

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ZERO HORA 23 de dezembro de 2016 | N° 18722. EM DIA


VINICIUS OCHOA PIAZZETA




Ainda que o título desta minha última coluna em 2016 remeta à célebre obra de Gabriel Garcia Márquez, não pretendo traçar maiores paralelos entre a morte de Santiago Nasar e a morte do “velho” Brasil, mesmo que a ideia seja bastante sedutora.

O ano vai chegando ao fim e gostaria de poder conversar com os leitores um pouco também sobre o Natal, seu significado e algumas reflexões sobre o crescente nacionalismo e egoísmo no mundo, ou ainda sobre o aspecto da data simbolizar também um momento de nascimento.

A vida é feita de escolhas, afinal, e o ano vai chegando ao fim legando-nos a inescapável conclusão de que muitas das opções feitas se mostraram equivocadas.

Um dos anos mais conturbados da história política e econômica do país. A destituição de mais um presidente da República, a recessão mais forte desde a quebra da bolsa em 1929, a prisão de congressistas, a escalada da inflação, o drible do presidente do Senado em um oficial de justiça, nosso Supremo Tribunal, sem falar nas quase 40 fases da Operação Lava-Jato, acrescidas das recentes movimentações do governo federal em revisitar a CLT, publicar programa de parcelamento de débitos tributários, e algumas outras, acabam impondo-se como assunto em todas as rodas de conversa que tenho participado, o que julgo auspicioso para o futuro.

No âmbito estadual, igualmente as coisas andam movimentadas. Sou um defensor do Jardim Botânico e tantas outras causas e iniciativas nobres; contudo, o fato é que o velho Brasil estava com sua morte anunciada e fizemos nada, ou muito pouco para reverter o quadro que nos trouxe até aqui, a essas difíceis decisões. Será preciso reconstruir o país, o Estado e o município em 2017.

E o único caminho para tanto é um engajamento cívico da população. Ativo e prévio à publicação das leis! Um interesse e uma participação maior nos assuntos econômicos, legais e tributários. Afinal, tudo é construído com o nosso dinheiro (contribuintes). Os ingleses pagam algo em torno de 710 reais por ano para manter a BBC, e há protestos regulares quanto a essa obrigatoriedade, por exemplo. Discussões assim são a verdadeira essência da cidadania, prática há muito esquecida ou negligenciada em terras brasileiras. Pelo que desejamos pagar?

Se o velho Brasil morreu de fato em 2016 e um novo Brasil precisa ser construído, somos nós, cidadãos, que deveremos tomar a trolha, o maço e o cinzel em nossas mãos. Feliz Natal a todos os leitores e a suas famílias e que todos façamos as melhores escolhas no ano que vai nascer.

 PRESIDENTE DA PACTUM CONSULTORIA EMPRESARIAL

terça-feira, 6 de dezembro de 2016

PAUTA MORAL




ZERO HORA 06 de dezembro de 2016 | N° 18707



ARTIGO | DENIS LERRER ROSENFIELD




Mais de meio milhão de brasileiros foram às ruas clamando pela ética na política, pela moralidade na administração da coisa pública. Os cidadãos não mais aguentam a corrupção e a apropriação privada e partidária dos recursos públicos, que pertencem à sociedade sob a forma de impostos, transferidos compulsoriamente para o Estado.

Cabe a este administrar os bens da sociedade, sem o que o próprio fato de cidadãos pagarem impostos, contribuições e taxas não teria nenhuma significação. As ruas hoje fiscalizam a utilização desses recursos. Trata-se de um dado incontornável, ao qual os políticos em geral não têm prestado a devida atenção.

O Brasil mudou. A classe política não acompanhou essa mudança. Permanece esta arraigada a práticas patrimonialistas que não são mais toleradas pela sociedade. Há uma espécie de estranhamento da cidadania que não se reconhece em seus representantes.

Prova disto consiste nas manobras operadas na Câmara dos Deputados e na Presidência do Senado para desvirtuar as 10 medidas contra a corrupção, que contaram com amplo respaldo popular. A operação consistiu em iniciativas de parlamentares, muito deles investigados e sob a mira da Lava- Jato, que procuraram, desta maneira, salvar a própria pele.

A inoportunidade das iniciativas foi completa. No momento em que estamos prestes a conhecer os detalhes das delações da Odebrecht, há uma evidente tentativa de impedir que políticos envolvidos sejam responsabilizados por seus crimes.

Evidentemente, o pacote de medidas contra a corrupção exigiria uma análise mais cuidadosa, porém exige o bom senso que não sejam os investigados os responsáveis por tal tarefa. Não possuem a qualificação moral necessária. E a moralidade tornou-se uma condição da política no Brasil.

As bandeiras das ruas foram “Contra a corrupção”, “Fora Renan” e “Fora Maia”, personificações, no caso, daquilo que não deveria ter sido feito. Aliás, esses presidentes exibiram uma ausência completa de sintonia com o que sente e pensa a sociedade brasileira.

O descompasso é total. Se persistirem nesta via, o meio milhão de participantes facilmente atingirá alguns milhões em pouco tempo. Se isto ocorrer, marcharemos inexoravelmente para uma crise institucional.

Enquanto isto, Lula e Dilma, dois ex-presidentes, dão adeus a um dos mais sanguinários e repressores ditadores, Fidel Castro. Sentirão, certamente, saudade. A reação moral da sociedade brasileira não lhes diz respeito. Não escutam as ruas. Faz sentido!

segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

O CONGRESSO NA MIRA DOS BRASILEIROS

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ZERO HORA 05 de dezembro de 2016 | N° 18706


POLÍTICA + | Juliano Rodrigues



A exemplo dos protestos que antecederam o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, milhares de brasileiros foram às ruas ontem em uma mobilização contra os políticos. Dessa vez, o principal alvo é o Congresso, personificado pelos presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Depois do Fora Cunha, que ajudou a empurrar Eduardo Cunha para uma cela em Curitiba, surgiram novos slogans: o Fora Renan e o Fora Maia.

O motivo das mobilizações é o movimento dos políticos, capitaneados por Renan e Maia, de mutilar o pacote anticorrupção. O discurso dos procuradores da força-tarefa da Operação Lava-Jato de que projetos como o do abuso de autoridade por parte de magistrados e membros do Ministério Público podem custar o andamento das investigações conquistou a adesão de parte da população. Diversos cartazes em defesa da Lava-Jato e dos responsáveis por investigar e julgar os crimes praticados no seu âmbito foram vistos nas ruas.

Além disso, foram estendidas faixas contra os deputados e senadores. A maior e mais expressiva estava na Avenida Paulista, em São Paulo, com os dizeres: “Congresso Corrupto”. Assim como nos protestos contra o governo Dilma Rousseff, as manifestações foram convocadas pelo Vem Pra Rua e pelo MBL. Embora os dois grupos tenham deixado claro que a mobilização não era contra o governo Temer, houve menções, em menor escala, contra o peemedebista. Um dos líderes do Vem Pra Rua, Rogério Chequer, foi para as redes sociais explicar:

– O Vem Pra Rua não é a favor de Fora Temer. Não temos nenhum interesse de tirar o Temer do poder.

A série de protestos aumenta a pressão sobre o Congresso em uma semana que promete votações polêmicas pelo Legislativo. Resta saber se os protestos terão efeito prático sobre os parlamentares, que já se mostraram insensíveis na terça-feira passada, quando mantiveram a sessão mesmo após a tragédia envolvendo o avião da Chapecoense. O mesmo Congresso que cancela sessões para que parlamentares nordestinos possam participar de festas juninas em suas bases.

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domingo, 27 de novembro de 2016

REPÚBLICA DO RABO PRESO

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ZERO HORA 6 de novembro de 2016 | N° 18699


OUTRA VISÃO


ASTOR WARTCHOW*



Hoje é a Câmara dos Deputados e o Senado Federal. Ontem foi o Fiat Elba, o dinheiro nas cuecas, a Petrobras, os fundos de pensão e muitos etceteras. A sucessão de escândalos permite três óbvias constatações que agravam nosso pessimismo. São apenas a ponta de um imenso iceberg denominado Estado brasileiro, um gigante fora de controle público. Afinal, predomina o império do “jeitinho” e da omissão, não havendo consequências administrativas e penais.

O espírito e ânimo do saque ao dinheiro público é uma epidemia nacional. Emprego de parentes, compadrio, favorecimentos e manipulação licitatória são comuns em todas as esferas da administração pública. Aliás, essas constatações me fazem lembrar de um comentário (dos eleitores) que muito ouvi ao longo das inúmeras campanhas eleitorais de que participei.

Em tempos de ditadura e abertura democrática, empenhados e otimistas na renovação político-partidária, éramos surpreendidos. Muitos cidadãos diziam: “É tudo igual mesmo. Melhor deixar o cachorro gordo no poder do que colocar um magro. Vai custar caro engordar outro!”

Ouvia triste e a contragosto porque não concordava. Como não concordo até hoje. Mas, no olhar e sentir de muitas pessoas do povo, a sucessão e a renovação político-partidária é uma simples troca de cachorros. Cachorros atrás do osso!

Voltando no tempo e na história, à época da colonização, e depois do fracasso das capitanias hereditárias, o governo português inventou os governadores-gerais. E com eles, a burocracia. Há registros históricos sobre o desembarque de nobres, funcionários públicos, soldados e criminosos (réus e degredados). Aliás, quase todos solteiros e interessados em grana fácil. Resultou uma estrutura estatal forte, organizada, centralizadora e burocrática. Que não encontrou resistência civil. Consequentemente, nossa sociedade de então se adaptou a essa estrutura estatal.

Trata-se do domínio de uma casta de altos funcionários aliada ao patronato político cujos interesses comuns formam uma associação parasitária. Juntos compõem uma rede que, espalhada pelo país, extrai dele tudo o que pode. Leia mais em Os donos do poder (1958), do gaúcho Raimundo Faoro (1925-2003).

O fruto principal dessa deformação histórica e dessa adaptação da sociedade é o “jeitinho brasileiro” e o famoso “querer levar vantagem em tudo”. Repito: nepotismo, compadrio, fraudes, falsificações, desrespeito a contratos, entre outros exemplos, são ações e atitudes que não sofrem reprovação moral. Ou então, quando descobertos, “não dá nada!”

De modo que o espírito do saque e o ânimo dominante confirmam a máxima de Aparício Torelly, o popular Barão de Itararé: “Negociata é um bom negócio para o qual não fomos convidados!”

Em verdade, estamos a merecer, como povo e sociedade, um apurado estudo de caráter sociológico sobre nosso caráter e nossa natureza (a)ética. Ou tudo será, simplesmente, falta de educação, repressão, punição e cadeia?

*Advogado

sábado, 19 de novembro de 2016

A SÍNTESE DO DESESPERO DOS POLÍTICOS ENLAMEADOS


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ZERO HORA 19 de novembro de 2016 | N° 18692




HUMBERTO TREZZI


A noite de quinta-feira terminou com imagens fortes. Desesperado ao saber que teria mesmo de passar uma temporada atrás das grades do temido complexo penitenciário de Bangu, o ex-governador fluminense Anthony Garotinho (PR) grita, esperneia, ameaça fugir. Tenta escapar da ambulância, mesmo de camisolão reservado aos pacientes (quando foi preso, na quarta-feira, alegou doença cardíaca e pediu para ser submetido a tratamento coronariano). O juiz não se comoveu e Garotinho foi mesmo para o presídio, ante gritos de protesto de sua filha.

Cobri para Zero Hora a eleição de Garotinho como governador do Rio em 1998. Ex-comunista na juventude, ele estava brizolista na época em que chegou ao governo fluminense. Passaria depois pelo PMDB e finalmente desembocaria no PR, onde está até hoje, numa encarnação da volubilidade ideológica dos políticos brasileiros. Impressionava sua postura, entre triunfante e debochada, ante qualquer pergunta.

Tinha resposta para todos os problemas do Rio – e conseguiu convencer a população, tanto que emplacou a mulher, Rosinha, como sucessora no governo (eleita em primeiro turno).

Que contraste entre o Garotinho daqueles anos e o homem grisalho que luta para fugir da prisão, filmado na quinta-feira... O segredo por trás dessa mudança atende pelo nome de foro especial (ou privilegiado). Garotinho perdeu essa condição ao não se eleger para cargo político. Foi para a prisão. O mesmo aconteceu, um dia depois, com seu adversário político e também ex-governador (e ex-aliado) Sérgio Cabral (PMDB).

Até pouco tempo atrás, políticos importantes no Brasil tinham direito aos salamaleques reservados para autoridades, na base do ditado “quem é rei não perde a majestade”. Não mais, a se julgar pelos presos da Lava-Jato e outras operações anticorrupção lideradas por policiais federais e procuradores. Garotinho perdeu não só a majestade, mas a altivez e o ar jovial que combinavam com o apelido. É apenas mais um entre os ex-políticos encarcerados – basta lembrar José Dirceu (PT), Eduardo Cunha (PMDB), Antonio Palocci (PT), João Cláudio Genu (ex-tesoureiro do PP), entre outros.

É por isso que muito parlamentar enlameado teme um castigo nas urnas em 2018. Podem se tornar os próximos ocupantes do cárcere.

ESTAMOS EM GUERRA!



ZERO HORA 19 de novembro de 2016 | N° 18692


OUTRA VISÃO | FERNANDO PITREZ




A afirmação que intitula este texto, embora aparentemente surrealista, é real e reconhecida pela maioria da sociedade, cônscia de suas prerrogativas e deveres. Nos dias atuais, estamos em uma verdadeira batalha sem tréguas contra políticos que, por dever constitucional e de própria consciência, teriam por obrigação preservar os interesses populares e preservar a honradez de seu encargo. As reclamações das redes sociais refletem a insatisfação e o repúdio do povo contra ações delituosas.

Nossa pátria amada está sendo saqueada por políticos inescrupulosos, preocupados muito mais em preservar seus próprios interesses e livrar-se dos ditames da lei. O triste espetáculo da famigerada Lava-Jato, cujas consequências são imprevisíveis, corrobora essa assertiva. As inescrupulosas artimanhas em curso, maquiavelicamente engendradas para anistiar o inaceitável delito do dito caixa 2, são um outro lustroso exemplo desta distorção. O escândalo da rapina da Petrobras por agentes inescrupulosos, a PEC 241, resultado de conchavos partidários condenáveis, são exemplos deploráveis da falta de mínimo respeito ao decoro parlamentar.

Este espaço restrito não me permite abordar outros tantos malfeitos, como diria a nossa ex-presidente. A hipocrisia, considerada um pecado moral, é virtude na prática parlamentar. Shakespeare, inclusive, já havia proclamado que “a política está acima da consciência”, o que é uma verdade inquestionável.

Os cidadãos passam com justa razão a repudiar a corrupção generalizada, exaustos de apreciar diuturnamente as acusações expostas pela mídia atuante. Passam então a exigir o cumprimento formal dos eleitos de sua preferência, as responsabilidades por eles assumidas antes do pleito. Não bastam mais meras promessas falaciosas, faz-se mister cumpri-las.

Inclusive, diante desses fatos, têm-se a impressão de que perderam completamente o senso de decência e de sua responsabilidade, passando a considerar a percepção coletiva como um rebanho de dóceis ovelhinhas.

É por esses e outro motivos que considero que “estamos em guerra” contra os políticos.

sábado, 5 de novembro de 2016

BRANCOS E NULOS, AS CONSEQUENCIAS PARA A DEMOCRACIA



Aumento dos votos nulos, brancos e abstenções é um recado que os políticos precisarão levar a sério: os eleitores clamam por mudanças mais profundas do que trocas de nomes em gabinetes

Por: Letícia Duarte
ZERO HORA 04/11/2016 - 14h02min 


Foto: Edu Oliveira / Agência RBS


O segundo turno da eleição deste ano definiu os novos governantes de 57 municípios do país, mas o grande vencedor ficou de fora desta lista. Correndo por fora dos palanques, o "não voto" bateu recorde e acabou eleito como melhor opção por 10,7 milhões de brasileiros – o que representa 32,5% do eleitorado que votou no último domingo. É o maior percentual de abstenções, brancos e nulos já contabilizado em um segundo turno desde que o Tribunal Superior Eleitoral passou a divulgar estatísticas digitalizadas, em 2004. Tanto que, em Porto Alegre, essa opção angariou 30 mil votos a mais do que os recebidos pelo futuro prefeito Nelson Marchezan Jr. (PSDB). E o fenômeno se repetiu país afora. No Rio, 41% do eleitorado não participou da escolha que resultou na vitória de Marcelo Crivella (PRB), maior patamar entre as Capitais.


Associado a um desencanto com a política, o fenômeno segue uma curva ascendente. No segundo turno de 2012, por exemplo, o total de abstenções, brancos e nulos foi de 26,5%, quase seis pontos percentuais menor do que o atual. Ainda que haja discussão sobre o número real de abstenções, já que em cidades onde houve recadastramento biométrico o índice diminuiu, o crescimento é considerado expressivo por especialistas. Se levados em conta apenas os votos brancos e nulos, o salto foi de 9,2%, no segundo turno de 2012, para 14,3% dos eleitores no domingo passado. Mas que consequências essa opção (ou a falta dela) traz? Se um dos pilares do sistema democrático é o voto, a progressiva recusa dos eleitores em participar dessa escolha poderia colocar em risco a própria democracia? Estamos vivendo um momento singular ou uma escalada consistente?

Analistas ouvidos pelo caderno DOC avaliam que, ao menos por enquanto, a democracia vai bem, obrigada. Não estaria ameaçada enquanto sistema. Mas alertam: a mensagem das urnas precisa ser ouvida pelos partidos. Porque é eloquente. E clama por mudanças reais, não apenas troca de jingles, siglas e rostos nos gabinetes. É uma ausência que grita.

– É um sinal amarelo muito forte, quase vermelho, porque a descrença está muito grande – avalia o advogado e pesquisador na área de política e judiciário Lincoln Noronha, doutorando em ciência política pela USP.

João Dória (acima) em São Paulo e Alexandre Kalil (abaixo) em Belo Horizonte: eleitos que vendem a imagem de homens ¿fora da política¿Foto: MARCELO GONCALVES / SIGMAPRESS/ESTADÃO CONTEÚDO


Foto: UARLEN VALéRIO / O TEMPO/ESTADÃO CONTEÚDO

Na sua avaliação, a deserção dos eleitores estaria relacionada a dois fatores principais: de um lado, a desconfiança da classe política, arrebatada pelos escândalos recentes escancarados pela Operação Lava-Jato. De outro, disputas locais marcadas por conjunturas menos acirradas – seja por previsibilidade do resultado, seja pelo fato de os eleitores não se sentirem representados por nenhuma das candidaturas.

– Quando a disputa está mais acirrada, as pessoas sentem que o voto delas pode fazer a diferença, o que em muitos lugares não aconteceu, e isso reduz a participação – observa Noronha.

Em um estudo que examinou os resultados desde 1985 até 2016 das eleições a prefeito em Curitiba, o professor Emerson Cervi, do programa de pós-graduação em Ciência Política da Universidade Federal do Paraná (UFPR), obteve uma amostra mais precisa do fenômeno. Ao calcular quantos votos válidos havia em cada eleição com relação a cada não voto, para medir um indicador chamado razão de voto válido, constatou que a legitimidade desta eleição é a menor da série histórica.

– A ideia desse índice não é olhar partido ou quem ganha, mas quanto há de participação para legitimar o eleito. Se tiver uma razão de 10 votos válidos para cada não voto, por exemplo, significaria que o eleito teve uma grande legitimidade. Se tiver uma razão de um voto válido para cada não voto, ainda que o candidato tenha feito 90% dos votos, ele não estaria legitimado, porque muita gente não participou – explica.

O resultado mostra que, nesta eleição em Curitiba, que elegeu Rafael Greca (PMN), houve a menor razão de votos válidos desde a redemocratização, tanto no primeiro quanto no segundo turno. No primeiro, a razão foi de 2,6. No domingo, caiu para 2,1.

– Até então, a nota mais baixa tinha sido a de 1992 (2,8), após o impeachment do Collor. E o interessante é que naquela eleição e nesta foi o mesmo prefeito eleito, o Greca. Ele é o cara que vem depois do tsunami – compara.

Para o professor, essa tendência de deslegitimação eleitoral está relacionada a um processo de "criminalização da política", que teria se acentuado nos últimos anos, na esteira de operações como a Lava-Jato e da cobertura midiática dos escândalos.

– Mesmo que se tente criminalizar um partido, para o eleitor a crise é geral, e isso o afasta. Quem perde são todos os integrantes da elite política, todos os partidos e os prefeitos eleitos. Não diria que é uma ameaça ao sistema democrático, mas é um problema para os líderes partidários e novos representantes, que vão ter mandatos mais frágeis. Não me parece que a democracia esteja em jogo, mas há quase uma posição deliberada de enfraquecimento da representação política e de fortalecimento de outras formas de representação, em especial por agentes burocráticos do Estado – interpreta o cientista político.

Ainda assim, Cervi não acredita que o não voto seja uma tendência irrefreável.

– São ciclos políticos que a gente tem que passar. Estamos no final de um ciclo, que coincidiu com a Lava-Jato, aumentou a rejeição do brasileiro em relação à política e o medo dos políticos de irem para cadeia. Isso fez com que todo o sistema político se desestabilizasse – salienta.

Na visão da professora Vera Chaia, do departamento de Política da PUCSP, a recusa dos eleitores em participar das urnas tem um viés positivo. Diante de um sistema adoecido por escândalos e negociatas, a massa insatisfeita mostra que não será conivente em respaldá-lo.

– Do ponto de vista da democracia é altamente salutar, porque mostra que muita coisa tem que mudar, senão vai ficar na mesma. O eleitor quer mudança, quer votar em quem ele confia, em quem tem proposta, não porque é obrigado a votar. Isso mostra aos políticos, à democracia, que são necessárias mudanças no sistema eleitoral, partidário, e com isso fica aberta a possibilidade de alteração no sistema para ampliar a confiança no eleitor – avalia.

Os críticos desse comportamento eleitoral costumam argumentar que quem se omite acaba governado pelos que se posicionam. Mas, segundo Vera, esse discurso tem pouco efeito sobre os que optam pelo não voto porque, na visão deles, não há verdadeira escolha.

– Nada vai mudar do ponto de vista deste eleitor, ele está se negando a participar desse processo, e isso tem de ser respeitado – opina.

Entre as mudanças que precisam ser discutidas para o aperfeiçoamento do sistema, a cientista política considera que seria saudável incluir a opção pelo voto facultativo, sistema em vigor em democracias maduras como os Estados Unidos e países europeus. No Reino Unido, por exemplo, 34% dos eleitores se abstiveram de votar nas eleições de 2015, que reconduziram David Cameron a um mandato de cinco anos após seu partido conquistar maioria no Parlamento. Uma das vantagens do voto facultativo, avalia a professora da PUCSP, seria que os partidos teriam de convencer o eleitor a votar – e apresentar propostas políticas consistentes.

– Hoje o eleitor vota sem vontade, é obrigado, e muitos se negaram a votar, porque não veem sentido, nada muda. É um recado muito claro do eleitor em relação ao nosso sistema político. Tivemos o impeachment, mas isso não significou mudança no sistema. O presidente atual continua a mesma prática política, com os mesmos vícios de distribuição de cargos, e o eleitor sabe o que está acontecendo, vê que não ocorreram mudanças fundamentais. A resposta do eleitor é negar a política e o processo eleitoral – diagnostica.

Para o sociólogo José Maurício Domingues, professor do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Uerj e pesquisador associado do Centro de Estudos Estratégicos da Fiocruz, é preciso compreender a lição dessa ausência.

– Mesmo que falem que as abstenções tenham a ver com o recadastramento eleitoral, não creio que seja por isso. A gente vem vendo um crescimento desses votos, e nesta eleição isso ficou particularmente acentuado. Não é por acaso que as pessoas pararam de votar, ou estão votando branco e nulo. As pessoas não estão vendo que a democracia está realmente próxima a elas, servindo para os projetos em que as pessoas se colocam por direito, por participação. Não é só que não tem um candidato para votar, é uma desilusão mais profunda. Houve um desencanto com o que a política significa – reflete.

Neste divã eleitoral, os ecos do desencanto ainda são imprecisos. Autor do livro O Brasil entre o presente e o futuro (Mauad, 2015), Domingues considera cedo para prever o que vai acontecer nas eleições de 2018.

– O sistema político deve estar ainda mais desestruturado, mas é uma eleição que conta muito. Não dá para fazer uma projeção simplista, porque a disputa presidencial é sempre uma coisa que mobiliza muito o eleitor, bota em questão o conjunto de sua vida – pondera.

Se, por um lado, há uma tendência de consolidação de forças mais conservadoras em curso, por outro, o cenário ainda deve ser bastante impactado pelos desdobramentos da Operação Lava-Jato. Quem serão os próximos atingidos? A resposta será crucial para determinar a nova correlação de forças.

– Para o PSDB foi bom num primeiro momento, mas tem que ver o que vai acontecer: se Serra, Aécio e Alckmin forem realmente atingidos por denúncias mais graves, também o PSDB pode acabar numa situação delicada. A esquerda está muito destruída, vai ter que se reinventar, e temos um centro mais moderno e democrático, que a Marina e a Rede poderiam representar, mas que está com muita dificuldade de emergir. Para o eleitor, está tudo meio esquisito. A esquerda ficou com uma cara ruim, mas não é uma coisa definitiva. Isso pode ser revertido – diz.



Porto Alegre teve mais brancos, nulos e abstenções do que votos em Marchezan


De cada quatro eleitores, um não compareceu às urnas, sete pontos percentuais a mais do que o registrado em 2012


Por: Itamar Melo
ZERO HORA 30/10/2016 - 21h59min


Nelson Marchezan Júnior teve 402 mil eleitores, menos do que a soma dos que não votaram em ninguém na CapitalFoto: Mateus Bruxel / Agencia RBS


Em Porto Alegre, 402 mil eleitores escolheram Nelson Marchezan Júnior e 262 mil optaram por Sebastião Melo, mas o maior contingente preferiu mesmo não ficar com nenhum dos dois. A soma de abstenções, brancos e nulos passou de 433 mil — 30 mil pessoas a mais do que as que elegeram prefeito o candidato do PSDB.

Em comparação com eleições anteriores, foi uma disparada histórica na proporção dos que não votaram em nenhuma das duas opções disponíveis. Uma em cada quatro pessoas habilitadas (25,2%) sequer compareceu à seção eleitoral, sete pontos percentuais acima do registrado no primeiro turno de 2012 e praticamente o dobro dos ausentes em 2000. Foram 277 mil abstenções — mais do que o número de votos do atual vice-prefeito, Sebastião Melo.

Para cientistas políticos, os dados sugerem que uma grande fatia dos porto-alegrenses não se sentiu representada nesse segundo turno.

— Pode-se dizer que eram dois projetos muito iguais. Isso cria a ideia do "tanto faz". A abstenção e os votos branco e nulo têm a ver com a indiferenciação dos candidatos, em termos de projetos. Isso retira muito da legitimidade da eleição — afirma a cientista política Mercedes Cánepa, professora aposentada da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).



O professor da UFRGS Gustavo Grohmann relaciona os resultados ao fato de parcela expressiva da população não se sentir contemplada pelas opções existentes, mas relativiza a importância do índice elevado de abstenções. Segundo ele, as ausências podem ser explicadas em parte por problemas no cadastro eleitoral. Ele considera mais relevante analisar os brancos e nulos. E, nesse particular, a eleição de domingo trouxe números alarmantes.


O índice dos que se deram ao trabalho de comparecer diante da urna e não selecionar nenhum dos dois candidatos foi o maior desde 2000. Os nulos representaram 13,36% (109 mil pessoas), contra 4,83% na eleição anterior. Os brancos pularam de 4,57% para 5,67% (46 mil).

— O resultado não chega a ponto de retirar a legitimidade do pleito, mas cabe investigar qual a natureza da insatisfação do eleitorado — avalia Grohmann.

Uma das expectativas da votação tinha relação com a proporção dos votos nulos. Com a exclusão de candidatos da esquerda da disputa, os eleitores desse campo passaram as últimas semanas em um debate ferrenho sobre como se comportar diante da urna. Uma parte defendia com fervor a anulação do voto, por considerar Melo e Marchezan igualmente intragáveis. Um outro grupo estridente propunha votar no atual vice-prefeito, por considerar o candidato tucano mais ameaçador. No fim das contas, tudo indica que os votos dos partidários de Luciana Genro (PSOL) e Raul Pont (PT) se pulverizaram.

O voto nulo avançou, mas não de forma tão acentuada: cresceu de 8,88% para 13,36% do primeiro para o segundo turno. Melo também cresceu, mas não arregimentou uma quantidade avassaladora dos votos da esquerda — ganhou cerca de 80 mil votantes extras no segundo turno, enquanto os dois candidatos de esquerda tiveram 215 mil eleitores em 2 de outubro. Para comparar, Marchezan avançou em 190 mil votos.

— Os números apontam que a esquerda se dividiu, uma divisão que já aparecia com muita clareza nas discussões — diz Mercedes Cánepa.



Indiferença — ou protesto — também se repetiu no resto do país

Porto Alegre teve uma quantidade histórica de nulos, brancos e abstenções, mas não foi um caso isolado no país. O segundo turno foi marcado pela indiferença ou o protesto dos eleitores em outras metrópoles importantes.

No Rio de Janeiro, os índices foram superiores aos da capital gaúcha. Os votos em branco ficaram ligeiramente abaixo (4,85% contra 5,67%), mas os cariocas optaram com muito mais avidez pela anulação ou a abstenção. Deixaram de comparecer à urna, na Cidade Maravilhosa, 26,85% dos eleitores. Os nulos foram 15,90%. No total, mais de 2 milhões de habilitados a votar não escolheram nenhum dos candidatos — 300 mil a mais do que a votação do vencedor, Marcelo Crivella (PRB).

Se em Porto Alegre os números são explicados pela parecença entre as opções, no Rio a situação era oposta. Os candidatos não podiam ser mais diferentes. Crivella é um bispo licenciado da Igreja Universal, de perfil ultraconservador. Seu oponente, Marcelo Freixo (PSOL), vem da esquerda radical. Entre um e outro, muitos eleitores de centro preferiram nenhum dos dois. Não se sentiram representados.

Em maior ou menor grau, o fenômeno repetiu-se em outras capitais, como Belo Horizonte (MG) e Curitiba (PR), que tiveram campanhas marcadas pela virulência. Na cidade paranaense, houve 20,12% de abstenções e 11,45% de nulos. Na metrópole mineira, os índices foram de 22,77% e 15,55%. Somando-se os votos brancos, também em Belo Horizonte o eleito, Alexandre Kalil (PHS), foi superado por larga margem pelos que não votaram em ninguém.

Segundo a cientista política Mercedes Cánepa, esse quadro tem a ver com o momento político e econômico do país.

— Essa é uma eleição muito difícil de avaliar, porque o processo está desfigurado por ocorrer durante uma recessão e em um momento de exceção, de um impeachment tido por muitos como golpe de Estado.

terça-feira, 1 de novembro de 2016

O VOTO EM NINGUÉM

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ZERO HORA 01 de novembro de 2016 | N° 18675



EDITORIAL




Somados, os eleitores que não votaram, os que votaram em branco e os que anularam o voto tinham força política para eleger qualquer candidato no pleito municipal concluído no último domingo. Na maioria das capitais e cidades que tiveram um segundo turno eleitoral, os votos em ninguém foram mais numerosos do que os apurados para os candidatos eleitos. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral, 10,7 milhões de pessoas optaram por não chancelar a escolha dos candidatos que governarão seus municípios pelos próximos quatro anos. As razões são variadas, mas convergem para uma evidência inequívoca: o desencanto dos cidadãos com a classe política.

Evidentemente, muitos desencantados também votaram, talvez mais por acreditar na democracia representativa do que propriamente nos partidos políticos e nos postulantes a cargos públicos. Mas o contingente de não votantes, somado aos eleitores que foram às urnas e renunciaram à escolha, assumiu proporções estarrecedoras. E deixou uma silenciosa, mas eloquente, mensagem de rejeição aos políticos.

Motivos para isso não faltam: os escândalos de corrupção, a Lava-Jato, os conluios pelo poder, a frágil identi- dade programática dos partidos, as negociatas e a pouca eficiência das administrações públicas, que arrecadam muito, gastam demais e dão retorno insuficiente aos cidadãos. Até mesmo na escolha dos novos prefeitos essa insatisfação ficou clara, pois prevaleceram o discurso apolítico e a opção pelo novo.

Vitoriosos e derrotados, portanto, têm um mesmo desafio: recuperar a confiança da população. Cabe debater prioritariamente, neste momento, como os eleitos superarão a descrença e governarão com legitimidade, sem ter apoio da maioria de suas populações. O voto em ninguém não pode ser interpretado apenas como manifestação de ressentimento das correntes que não tinham candidatos. É mais do que isso: é um clamor do país por mudança no modo de se fazer política.

O que não se pode ignorar é que esse voto de desapontamento não deixa de ser um voto pelo Brasil. Ao manifestar com clareza sua frustração, os eleitores estão exigindo novas posturas, ideias mais arejadas, comprometimento com a ética e com o interesse público. Com mais legitimidade ainda, é o que também devem exigir os brasileiros que votaram e elegeram seus candidatos, pois o exercício da cidadania não se esgota no processo eleitoral. Se o voto em ninguém é um alerta, o voto consciente e endereçado é uma credencial irrenunciável de participação.


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - NESTAS ELEIÇÕES MUNICIPAIS, OS VENCEDORES NÃO REPRESENTAM O POVO. SINAL DE DESENCANTO E DESCONFIANÇA NOS POLÍTICOS, NOS PARTIDOS, NOS GOVERNANTES E NOS REPRESENTANTES LEGISLATIVOS. O povo brasileiro está exigindo punição e banimento dos políticos e partidos corruptos e uma ampla e contundente reforma capaz de resgatar a confiança nos governantes, nos legisladores e nos fiscais.

quarta-feira, 26 de outubro de 2016

PARA ONDE VAI O DINHEIRO QUE FALTA PARA OS SALÁRIOS



ZERO HORA 26 de outubro de 2016 | N° 18670


POLÍTICA + | Rosane de Oliveira





Ao olhar para a receita de impostos, os servidores do Executivo têm dificuldade para entender por que deverão receber no final de outubro menos do que entrou no último dia útil de setembro. A tabela abaixo joga luzes sobre as contas do Estado: de 24 a 31 deste mês, a Secretaria da Fazenda vai pagar contas que somam R$ 740 milhões com o ICMS dos combustíveis, da energia elétrica e das telecomunicações.

A maior fatia – R$ 300 milhões – é o duodécimo dos poderes. Vai para a folha de pagamento do Judiciário, do Ministério Público, da Assembleia Legislativa, do Tribunal de Contas e da Defensoria Pública, que recebem em dia. O segundo maior volume de recursos desse bolo será para o custeio da saúde – R$ 184,1 milhões. Há pelo menos R$ 63 milhões de gastos indiretos com servidores (Pasep, contribuição patronal ao IPE Saúde e ao Fundoprev) e R$ 93 milhões em precatórios e Requisições de Pequeno Valor (RPVs), a maioria referentes a sentenças em ações transitadas em julgado, movidas por funcionários ativos e inativos.

Para pagar a primeira parcela dos salários, no dia 31, o governo vai contar com repasses federais e avançar sobre o caixa único, usando recursos de estatais e dos outros poderes. Se houver algum resíduo em depósitos judiciais, serão usados até o limite de 95% do saldo, apesar do alto custo desse empréstimo. São R$ 30 milhões neste final de mês em juros pela utilização dos depósitos de terceiros.

Alguma dessas contas poderia deixar de ser paga? A Secretaria da Fazenda diz que não. Mesmo que a fonte por onde entra o dinheiro seja a mesma, os poderes têm autonomia orçamentária. Se o governo não repassar, o Judiciário pode bloquear as contas, como faz com parte das RPVs e dos repasses para hospitais.

A dívida externa e a extralimite (R$ 50 milhões), que têm a União como avalista, precisam ser pagas, sob pena de bloqueio dos repasses federais. Limpeza de prédios, merenda escolar, comida para presos, combustível para a polícia? Impossível não pagar.

O resultado desse cobertor curto é que, mais uma vez, o parcelamento deve atingir quase 100% dos servidores do Executivo. A folha de pagamento rodou com nove faixas (o máximo que o sistema permite), mas a Fazenda não adianta quantas serão pagas no primeiro dia. De acordo com previsões extraoficiais, o valor não deverá ser superior a R$ 500 por matrícula.

PRINCIPAIS PAGAMENTOS DE 24 A 31/10

Serviços de saúde R$ 184,1 milhões

Duodécimos dos Poderes R$ 300,5 milhões

Precatórios R$ 39 milhões

RPVs – Pagamentos R$ 29,7 milhões

RPVs – Bloqueio judicial R$ 24 milhões

Custo dos depósitos judiciais R$ 30 milhões

Dívida externa e extralimite R$ 50,2 milhões

Manutenção de estradas (Daer) R$ 16,44 milhões

Serviços de limpeza, vigilância, combustíveis e alimentação R$ 26,3 milhões

Pasep R$ 12,28 milhões

Transporte escolar R$ 11 milhões

Autonomia das Escolas R$ 6,32 milhões

Merenda escolar R$ 1,08 milhão

Fundo de segurança pública R$ 2,4 milhões

IRGA R$ 5 milhões

IPE Saúde patronal R$ 44,25 milhões

Fundoprev patronal R$ 7,61 milhões

Bolsas de pesquisas R$ 2,25 milhões

terça-feira, 4 de outubro de 2016

O ELEITORADO DESCRENTE



COMENTÁRIO DO BENGOCHEA
- A descrença nos políticos é produto de um povo nada solidário e individualista que trata o voto como instrumento obrigatório ou de vantagem pessoal, ao invés de enxergar no voto um direito social, um instrumento de cidadania e uma "arma" cívica capaz de fortalecer as leis e a justiça na defesa de todos, prover direitos individuais e coletivos, reduzir a tributação exorbitante e gerar melhoria na qualidade de vida das pessoas, das famílias e das comunidades. É culpa também de uma justiça leniente, condescendente e tardia que não consegue punir e nem barrar os políticos corruptos, permitindo que eles continuem na condição de "suspeitos"  livre, soltos e impunes na vida pública e concorrendo a cargos públicos sem se intimidar com a lei, com a justiça e com a polícia, favorecidos por imunidades e amplos recursos.

ZERO HORA 04 de outubro de 2016 | N° 18651



EDITORIAIS





Em nove capitais brasileiras, o número de votos brancos, nulos e de eleitores que não compareceram às urnas foi maior do que o do candidato que ficou em primeiro lugar nesses municípios. Isso ocorreu, inclusive, nos dois maiores colégios eleitorais do país, São Paulo e Rio de Janeiro, além de Belo Horizonte, Porto Alegre, Curitiba, Belém, Cuiabá, Campo Grande e Aracaju. O re-cado dos não eleitores é claro: esse grupo de brasileiros está desencantado com os políticos e com a política da maneira como vem sendo praticada no país.

A Operação Lava-Jato, que desnudou o mais amplo esquema de corrupção da administração pública na história da nação, e a participação dos grandes partidos nesse esquema delituoso, especialmente daqueles que vêm ocupando o poder nas últimas décadas, contribuíram fortemente para o sentimento de decepção coletiva. Mas o principal elemento motivador da indiferença política é a dificuldade dos eleitores para identificar bons candidatos entre os pretendentes a cargos públicos, potencializada por discursos e promessas dissociados da realidade.

Resgatar a confiança desse eleitorado descrente, portanto, passa a ser o grande desafio dos eleitos. Para isso, os prefeitos e vereadores que logo assumirão seus mandatos precisam focar suas ações e administrações na transparência, na seriedade e no gerenciamento eficaz dos gastos públicos. Devem considerar que o desencanto não se restringe aos eleitores que não votaram ou invalidaram seus votos. Também os cidadãos que apostaram em determinados candidatos exigem honestidade e permanente prestação de contas, para continuar acreditando na representação política como sustentáculo da democracia.

Depois do voto, é imprescindível continuar acompanhando e fiscalizando os eleitos, pois os eleitores que se omitiram, querendo ou não, também estão sendo representados por aqueles que votaram por todos.

DESENCANTO EXPRESSO EM NÚMEROS



ZERO HORA 04 de outubro de 2016 | N° 18651


POLÍTICA + | Rosane de Oliveira





O recado das urnas não poderia ser mais claro: o eleitor brasileiro está descontente com os rumos da política e expressa sua insatisfação deixando de participar do processo eleitoral ou votando nulo ou em branco, mesmo que esse protesto não tenha qualquer efeito prático. O elevado índice de abstenção na maioria dos municípios brasileiros sugere que o fenômeno é generalizado e que tende a se agravar no segundo turno, se os finalistas da eleição não se reciclarem.

Se em Porto Alegre, com nove candidatos disputando a prefeitura e 600 concorrendo a uma das 36 vagas na Câmara, 382 mil não se sentiram representados, o que esperar do segundo turno, quando será preciso escolher entre dois? Conquistar esses corações e mentes desencantados é o desafio número 1 de quem foi para o segundo turno, não só em Porto Alegre, mas também em Canoas, Caxias do Sul e Santa Maria.

Ainda que parte dessa abstenção deva ser debitada à desatualização do cadastro e outra às pessoas que estavam foram do seu domicílio, os números são chocantes se comparados aos votos dados aos candidatos. Nelson Marchezan, o primeiro colocado, que teve 213.646 mil votos. O total de abstenções acima da votação do melhor colocado se repetiu em outras 10 capitais, incluindo São Paulo, onde João Doria venceu no primeiro turno. Os brancos e nulos somaram 135 mil em Porto Alegre, número superior à votação do terceiro colocado, Raul Pont.

Em comparação com 2012, o crescimento das abstenções e dos votos brancos e nulos foi significativo em Porto Alegre. Há quatro anos, foram 199 mil ausentes e 82 mil brancos e nulos.

O desencanto dos eleitores coincide com um momento de descrédito dos partidos e das instituições relacionadas à política. Pesquisa recente do Ibope mostrou que em uma lista de 18 instituições, os partidos estão em último lugar na escala de confiança dos eleitores. Nessa lista, encabeçada por bombeiros, Igreja e Forças Armadas, os governos, o Judiciário e o Congresso estão na parte de baixo.

Líderes de diferentes partidos reconhecem que o recado das urnas é inequívoco e que o eleitor exige uma resposta. A maioria, incluindo o presidente Michel Temer, acha que essa resposta é a reforma política.

Ainda que seja compreensível o desencanto dos eleitores com a política em tempos de Lava-Jato, de impeachment e de promessas vazias, o voto branco ou nulo é um protesto inútil. Além de terceirizar a decisão, quem se omite pode estar contribuindo para a eleição de um candidato menos qualificado.




sexta-feira, 23 de setembro de 2016

POR QUE DEPOR UM GOVERNO TÃO BOM?

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ZERO HORA 23 de setembro de 2016 | N° 18642


DAVID COIMBRA




Um governo que faz dobrar o número de empregos na indústria merece ser deposto?

Um governo que faz a taxa de mortalidade infantil cair em mais de 50% merece ser deposto?

Um governo que faz triplicar o número de venda de livros merece ser deposto?

Um governo que propicia aumento de renda per capita em mais de 50% merece ser deposto?

Um governo que reduz o índice de analfabetismo em 30% merece ser deposto?

Um governo que faz com que o volume de exportações aumente mais de 20 vezes merece ser deposto?

Um governo que aumenta a rede de estradas asfaltadas no país em mais de 15 vezes merece ser deposto?

Um governo que faz o país crescer mais do que qualquer outro país do mundo merece ser deposto?

Merece.

Esse governo, o governo dos índices que apresentei acima, foi o governo militar.

Para você ver como os números são escorregadios. Você toma uma estatística e joga com ela como bem entender, sobretudo em um país do tamanho do Brasil.

Você pode também usar exemplos particulares, para tornar a coisa mais humana. Depoimentos pessoais geram convenientes reações emotivas. Eu, por exemplo: neto de um sapateiro que teve de aprender a fazer contas sozinho, filho de uma professora primária que tinha de sustentar três filhos, sem contar com pensão, eu, oh, que vida dura, só estudei em escola pública e fiz faculdade graças a um programa do governo federal. E a minha mãe, a tal professora primária, só conseguiu comprar nosso apartamento no IAPI graças a um programa do mesmo governo federal.

Que governo benfazejo foi esse?

O governo militar.

Então, o governo militar não foi maravilhoso?

Não.

Foi péssimo.

Porque o governo militar, ao funcionar como uma ditadura, corroeu o país por dentro. A ditadura por princípio é ruim, e não apenas por ser totalitária, mas por tirar do cidadão a responsabilidade pela formação do Estado. Quem manda é o ditador; logo, a responsabilidade é dele. O cidadão olha para cima, para onde ele acha que se assenta o Estado, e lava as mãos. O cidadão apenas se queixa.

Um governo não pode pretender ser a salvação de um país. Basta o governo acreditar que tem essa missão para corromper a sociedade. É a sociedade que se salva, com todas as suas instâncias, com seus instrumentos, com o “sistema”, jamais com o governo. O governo é apenas parte do Estado, é o executivo, que vai gerir o serviço público de acordo com parâmetros já definidos pela sociedade.

Um governo populista, como foi o do PT, faz o mesmo tipo de trabalho corrosivo que fez a ditadura, ainda que legitimado pelo voto. O pai Lula. A mãe Dilma. O partido de homens iluminados que defendem o pobre negro da elite branca malvada. Não existe diferença entre essas crenças e a crença no que se chamava de “governo forte”. É esse primitivismo que amassa o Brasil.

O Brasil não tem que esperar por um bom governo. O Brasil não necessita de um bom governo. O Brasil precisa desconfiar de todos os governos.

terça-feira, 20 de setembro de 2016

A PROFISSÃO MAIS HONESTA

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ZERO HORA 20 de setembro de 2016 | N° 18639


EDITORIAIS





Na antevéspera de novo pleito eleitoral, no momento em que os candidatos tentam conquistar a confiança dos eleitores descrentes na política, ganha especial relevo a manifestação polêmica do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante o pronunciamento de resposta aos procuradores da Operação Lava-Jato. A profissão mais honesta é a do político disse Lula, complementando: Porque todo ano, por mais ladrão que ele seja, ele tem de ir pra rua encarar o povo e pedir voto.

Nem é preciso refletir muito para se perceber a infelicidade da declaração. Em primeiro lugar, política não deveria ser uma profissão, mas um serviço público prestado por tempo determinado por pessoas da sociedade que os cidadãos escolhem para representá-los. Em segundo lugar, não existe mais ou menos desonestidade. Se um político é ladrão, pouco importa se ele tem que pedir votos periodicamente. O indivíduo desonesto não serve para exercer mandato.

A verdade é que não se pode flexibilizar honestidade. Todas as profissões são dignas quando exercidas com lisura e integridade. Vale o mesmo para a representatividade política. Por isso é importante que os eleitores acreditem na existência de pessoas honestas e procurem orientar seus votos para estes indivíduos, informando-se sobre eles, examinando sua vida pública, sem cair na armadilha da generalização de que todo político é desonesto. Se o eleitor se recusa a escolher, alguém escolhe por ele – e aí, sim, cresce o risco de que algum desonesto seja eleito.

sexta-feira, 19 de agosto de 2016

CRISE DE CONFIANÇA NAS INSTITUIÇÕES



A JUSTIÇA CAI E O CONGRESSO NACIONAL SEGUE SENDO A INSTITUIÇÃO MAIS DESACREDITADA DO BRASIL. Se as instituições que sustentam os dois grandes pilares da democracia - Lei e Justiça - não têm a confiança do povo é porque não existe Estado Democrático de Direito no Brasil, nem lei e nem justiça, mas uma oligarquia governante que governa para si e não para o povo. Com poderes desacreditados que priorizam interesses corporativos e demonstram práticas de imoralidade, leniência, permissividade, suspeitas e divergências não há como construir uma sociedade livre, justa, solidária, em paz e com qualidade de vida.


RANKING IBOPE - Índice de Confiança Social do Brasileiro (ICS)


1) Corpo de Bombeiros - 83
2) Igrejas - 67
3) Polícia Federal - 66
4) Forças Armadas - 65
5) Meios de Comunicação - 57
6) Escolas Públicas 56
7) Empresas - 55
8) Organizações da sociedade civil - 52
9) Polícia - 52
10) Bancos - 50
11) PODER JUDICIÁRIO - 46

12) Sindicados - 40
13) Sistema Eleitoral - 37
14) Governo Federal - 36
15) Saúde Pública - 34
16) Prefeitura Municipal - 32
17) Presidente República - 30
18 ) CONGRESSO NACIONAL - 22
19) Partidos Políticos - 18



ZERO HORA 9 de agosto de 2016 | N° 18612


POLÍTICA + | Rosane de Oliveira




A descrença perceptível em qualquer roda de conversa sobre política aparece quantificada no Índice de Confiança Social do Brasileiro (ICS), uma pesquisa anual do Ibope que avalia a percepção dos eleitores em relação a 18 instituições do país. Numa escala de zero a cem, o índice geral de confiança é de 50, um ponto a mais do que no ano passado, quando atingiu o nível mais baixo desde 2009. Na média das instituições pesquisadas, o ICS cai para 46.

A pesquisa foi realizada pelo Ibope Inteligência entre os dias 14 e 18 de julho, com 2002 entrevistas, em 142 municípios brasileiros. A margem de erro é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos, em um intervalo de confiança de 95%.

No topo da lista das instituições mais confiáveis, está o Corpo de Bombeiros, medalha de ouro com 83, seguido das igrejas, com 67. Como a pesquisa avalia as mesmas instituições na série histórica, o terceiro lugar do ranking fica com as Forças Armadas (65), mas a verdadeira medalha de bronze nesse pódio seria da Polícia Federal, com índice de confiança 66. É que, neste ano, o Ibope incluiu dois atores novos na pesquisa, a PF e o Ministério Público, sem considerá-los no cálculo do ICS. Se fizer um corte na metade da tabela, os meios de comunicação aparecem na parte de cima, com 57, seguidos de escolas públicas (56), empresas (55), organizações da sociedade civil (52), polícia (52) e bancos (50).

Na lanterna, estão os partidos políticos, com apenas 18 numa escala de zero a cem. Abaixo de 50, o que pode ser traduzido por reprovação, figuram o Poder Judiciário (que caiu de 52 em 2009 para 46 neste ano), os sindicatos (40), as eleições e o sistema eleitoral (37), o governo federal (36), o sistema público de saúde (34), o governo da cidade do entrevistado (32), o presidente da República (30) e o Congresso Nacional (22).

Os números só não são mais desalentadores para Michel Temer porque houve uma evolução positiva em comparação com 2015, quando o governo federal teve 30 e a presidente da República, 22.

A série mostra que a confiança nas instituições começou a despencar em 2013, na esteira dos movimentos que tomaram as ruas das principais cidades. O ICS caiu de 60 em 2009 para 50 em 2013.



quinta-feira, 11 de agosto de 2016

ELEITOR LUDIBRIADO


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Muito bom e oportuno este artigo de Antonio Augusto. Realmente é "vetusto", imoral, escuso e inoperante o sistema eleitoral brasileiro que favorece e elege  caciques partidários e políticos corruptos, dando poder aos partidos corruptos e à uma máfia infiltrada nos poderes de República, estatais e empresas privadas que lidam com obras e serviços públicos. A "falta de representatividade" é real, as coligações formam alianças visando interesses pessoais, partidários e corporativos, cargos são ocupados até por quem não foi eleito, e há políticos que não exercem os cargos para os quais foram eleitos, preferindo cargos no poder Executivo. "O voto individual transforma as campanhas em lutas “vale- tudo” e o eleitor é levado a achar que seu candidato vai atender seus anseios, mas não percebe que é o partido dele que vai determinar os rumos da carreira e do mandato do candidato eleito. Sou a favor do voto facultativo e distrital, e se seria ótimo se este sistema fosse praticado dentro do voto em lista, modalidade que dá transparência à probidade, moralidade e eficiência do partido pelos nomes que apresenta ao eleitorado. Além disto, os tribunais de contas, a justiça eleitoral e as altas cortes de justiça precisam exercer seus deveres para barrar e banir os corruptos da vida política, ao invés de permitir a prescrição, a impunidade e a candidatura deles.

Encerro com a brilhante conclusão do Antonio: "Por fim, deve ser dito que poder não é dizer apenas “sim” para bons candidatos, aliás, os escravos só podiam dizer sim. Poder é dizer “não” aos maus candidatos e aos partidos que os acolhem. Os maus partidos não podem continuar impunes. Esta, sim, uma medida anticorrupção!"



ZERO HORA 11 de agosto de 2016 | N° 18605


ANTONIO AUGUSTO DAVILA



Difícil de acreditar que ainda esteja em vigor o vetusto sistema eleitoral brasileiro – adotado em 1935 frente a dificuldades operacionais na apuração de votos em papel – sem similar em qualquer grande país desenvolvido. Ele daria ao eleitor o poder de eleger o “seu” candidato a deputado ou a vereador, bastaria uma boa escolha e tudo seria resolvido. Puro engodo: em grande número de Estados e municípios, o conjunto dos eleitos não representa a maioria dos eleitores. Entre tantos exemplos, nas últimas eleições em Porto Alegre, 57% dos votos válidos não foram dados aos vereadores eleitos. Falta de representatividade agravada pela proliferação partidária. As maiorias e as grandes minorias – classe média, mulheres, afrodescendentes – são punidas, e, ao revés, as minúsculas minorias e corporações bem organizadas são beneficiadas. Além disso, campanhas de incentivo à participação do cidadão e, em especial, das mulheres pioram o quadro atual, pois provocam maior diluição dos votos conscientes. Assim, os maus políticos, rechaçados pela opinião pública, mas com bons currais eleitorais, se elegem e se reelegem com incrível facilidade.

O voto individual transforma as campanhas em lutas “vale- tudo”, de todos contra todos, inclusive quanto ao ilícito e à corrupção, e inviabiliza a efetiva fiscalização, basta constatar que nas próximas eleições haverá no país cerca de meio milhão de candidatos e de prestações de conta individuais.

Por outro lado, o argumento de que o voto partidário ou em lista fechada beneficiaria os “caciques” é pífio. Se fosse válido, há muito o teriam implantado. A propósito, apesar de suas extraordinárias votações, em que posição os partidos listariam nomes como os de um “maluf” ou de um “bolsonaro”? E qual partido deixaria de colocar mulheres e afrodescendentes em lugar de destaque na lista?

Por fim, deve ser dito que poder não é dizer apenas “sim” para bons candidatos, aliás, os escravos só podiam dizer sim. Poder é dizer “não” aos maus candidatos e aos partidos que os acolhem. Os maus partidos não podem continuar impunes. Esta, sim, uma medida anticorrupção!

Economista

sábado, 30 de julho de 2016

O ESTADO VIROU UM INFERNO



Foto: Gilmar Fraga / Arte ZH / Arte ZH



ZERO HORA 30/07/2016

DAVID COIMBRA


Como a inação do governo afeta o espírito do cidadão



Sartre disse que o inferno são os outros, e, de fato, são vocês. As pessoas têm a irritante mania de não querer as coisas que quero que elas queiram e de não fazer as coisas que quero que elas façam. Você pode planejar tudo direitinho, ter as melhores ideias, mas elas vivem tomando suas próprias decisões. Cada qual com suas vontades e seus interesses. Donde, tantos conflitos. Donde, o inferno.


Para haver quereres conflitantes, basta haver outra pessoa. Os casais têm problemas às vezes irremediáveis, e casais são formados por apenas dois seres humanos, imagine. Pense, agora, em uma cidade inteira, ou um Estado, ou um país. Como fazer com que milhares, milhões de pessoas vivam em relativa harmonia?

Essa é, basicamente, a função do Estado. Para isso foi, digamos, "inventado" o Estado: para regular as relações entre as pessoas. E é por isso que a ação do Estado influencia diretamente o espírito dos cidadãos.

Corta.

***

Fiz essa pequena digressão para falar de algo que ocorreu nesta sexta-feira em Porto Alegre.

O dia estava ensolarado e o clima ameno. Um pequeno grupo de alunos e professores fazia uma manifestação na Avenida Ipiranga, em protesto contra o parcelamento dos salários dos funcionários públicos. Eles trancaram o trânsito, como sói acontecer nesses eventos. Um motorista, irritado por ter seu caminho obstruído, simplesmente seguiu em frente, atropelando uma jovem. Uma professora foi se queixar. Ele saiu do carro e, segundo ela, desferiu-lhe dois socos no rosto. O homem, que estava com pressa, não pôde retomar seu caminho: foi preso e provavelmente perdeu muito mais tempo do que se tivesse esperado pelo fim do protesto.

Corta de novo.

***

Repare como há interesses conflitantes nesse incidente, e erros também.

Professores e alunos, querendo se manifestar, obstruíram uma via pública. Estavam errados, infringiram a lei.

O motorista irritado não chamou a polícia ou um fiscal de trânsito a fim de resolver o problema e cometeu um erro muitíssimo mais grave do que o dos manifestantes: agrediu duas pessoas. Pior: duas pessoas mais fracas fisicamente, duas mulheres, uma delas quase uma criança.

As pessoas gritavam, quando ele foi preso: "Covarde, covarde!". Estavam certas, ele foi covarde e merece ser punido.

Corta mais uma vez.

***

Quem é o principal responsável por essa ocorrência? Quem cometeu mais erros?

O Estado.

O homem que partiu para a agressão física não deve por um só segundo ter pensado em pedir a mediação de alguma autoridade, porque no Rio Grande do Sul as autoridades não fazem mediação, não resolvem conflitos, apenas deixam passar.

Mas há uma motivação sub-reptícia, mais sutil e mais cruel, causada pela forma como se comporta o governo do Rio Grande do Sul. Esse é o governo do fracasso anunciado, o governo da depressão, o governo do não, e Chico Buarque já dizia que vence na vida quem diz sim. Há um ano e meio, o governo repete que o Rio Grande do Sul faliu, que tudo acabou. Pode até ser verdade, decerto que é, mas e as soluções? E a saída? Qual é a saída? O governo, afinal, foi eleito para encontrar saídas.

Mas não. O governo, a cada mês, esmaga mais um pouco do que resta do amor-próprio do cidadão. As pessoas estão cansadas no Rio Grande do Sul. As pessoas estão aborrecidas. As pessoas estão com medo. E não há nada que gere mais fúria do que o medo.

Lidar com os outros, naturalmente, já é difícil. Se quem deveria mediar os conflitos se omite, isso se torna quase impossível. Torna-se um inferno. Sim: o governo está transformando o Rio Grande do Sul em um inferno.

quinta-feira, 28 de julho de 2016

APERTEM OS CINTOS, A SITUAÇÃO PIOROU


ZERO HORA 27/07/2016

ROSANE DE OLIVEIRA

Receita de julho ficou R$ 120 milhões abaixo da de junho e Estado deverá pagar menos de R$ 1,5 mil para servidores do Executivo nesta sexta-feira


Servidores do Executivo terão nesta quinta-feira a confirmação de uma péssima notícia: a situação das finanças estaduais piorou e a parcela do salário a ser paga no último dia útil de julho ficará bem abaixo da expectativa inicial. A intenção de pagar pelo menos R$ 2,6 mil no primeiro dia foi pelos ares com a queda de R$ 120 milhões da receita líquida em comparação com junho. De acordo com previsões extraoficiais, a primeira parcela ficará abaixo de R$ 1,5 mil.

Às 11h, quando anunciar as faixas de pagamento, o secretário da Fazenda, Giovani Feltes, deverá abrir os números da receita e da despesa para mostrar por que a primeira parcela ficará tão abaixo dos R$ 3 mil pagos em 30 de junho. Basicamente, houve uma conjunção de fatores negativos. A saber:

1. Os repasses federais – especialmente o Fundo de Participação dos Estados – tiveram uma queda drástica em consequência da recessão;

2. Mesmo com o aumento das alíquotas, a arrecadação de ICMS se manteve praticamente no mesmo patamar de julho de 2015. Foram R$ 2 bilhões no ano passado e R$ 2,137 bilhões neste mês. Descontada a inflação, significa que houve uma queda real de receita;

3. Em junho, o saldo dos depósitos judiciais, que vem caindo mês a mês, era de R$ 202 milhões. O governo retirou R$ 105 milhões. Agora, o saldo é de R$ 121 milhões, o que impede novos saques;

4. Neste mês, a Secretaria da Fazenda teve de pagar uma parcela de R$ 40 milhões da dívida externa;

5. O Executivo pretendia usar parte do dinheiro dos outros poderes, que está no caixa único, mas teve de liberar R$ 45 milhões para que Judiciário, Ministério Público, Assembleia Legislativa, Defensoria Pública e Tribunal de Contas pagassem parte do reajuste de seus servidores. O aumento é retroativo a 1º de janeiro deste ano. O TJ e a Assembleia pagarão o correspondente a dois meses do passivo.

A situação tende a se agravar nos próximos meses, apesar da suspensão do pagamento da dívida com a União até o final do ano. O salário de julho deverá ser quitado até 19 de agosto. O de agosto corre o risco de ser liquidado somente no final de setembro ou início de outubro. Daí para a frente, a conclusão do pagamento se dará cada vez mais tarde. Para pagar o 13º salário dentro do ano, o governo vai, mais uma vez, recorrer ao empréstimo do Banrisul em nome dos servidores.

sábado, 9 de julho de 2016

NA CONTA DO CONTRIBUINTE



ZERO HORA 09 de julho de 2016 | N° 18577


POLÍTICA + | Juliano Rodrigues




CONTA DA IRRESPONSABILIDADE RECAI SOBRE O CONTRIBUINTE


A cada dia que passa, fica mais evidente que o governo interino de Michel Temer seguirá lógica semelhante à da gestão de Dilma Rousseff e repassará à sociedade brasileira a conta pela forma irresponsável como as finanças públicas foram administradas nos últimos anos. Enquanto estava na Presidência, Dilma cometeu uma série de erros que provocaram um profundo desequilíbrio nas contas do país. A consequência disso foi a queda da confiança dos investidores, que levou a economia para um cenário de recessão, materializado no crescimento do desemprego ena inflação alta.

Para contornar essa situação, o governo Temer encampou o discurso da austeridade e deu a largada em algumas mudanças que podem voltar a atrair os investidores e iniciar a reversão do quadro de dificuldade que vive o Brasil. O preço disso será pago por todos: estão no horizonte aumento de impostos, mudanças na legislação trabalhista e reforma na Previdência. A elevação do imposto sobre o combustível (a Cide) é uma das medidas prioritárias e pode gerar R$ 15 bilhões a mais por ano aos cofres da União. Por óbvio, a mudança incidirá no preço da gasolina e, por consequência, da produção como um todo.

Na sexta-feira, o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Braga de Andrade, defendeu a ideia de ampliar a carga horária dos trabalhadores do setor, de 44 horas semanais para até 60 horas. Por um ato falho, Andrade falou em aumento para 80 horas, citando a alteração promovida na França (que na verdade elevou para 60 horas semanais). Antes de fazer essa declaração, o presidente da CNI passou mais de duas horas reunido com o presidente interino Michel Temer.

No caso da Previdência, o governo provisório terá sérios problemas em convencer as centrais sindicais e os servidores públicos de que é inevitável criar mecanismos para retardar as aposentadorias. A adoção da idade mínima (que seria de 65 anos) como maneira de tornar o sistema mais sustentável também enfrenta resistências.

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TERRAS PELA DÍVIDA

Para abater parte da dívida que tem com a União, o governo do Estado transferiu ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) dois lotes de terra localizados nos municípios de Cruz Alta e Vitória das Missões. O valor de cada terreno ainda será avaliado e, por isso, não há dimensão sobre quanto o RS quitará da conta que tem com o governo federal. Hoje, o Estado deve R$ 51,6 bilhões para a União.

As áreas, que servirão para assentamentos rurais, são de propriedade da Companhia Estadual de Silos e Armazéns (Cesa) e somam 243,5 ha. O ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, participou da cerimônia que consolidou um termo de compromisso.

Segundo ele, esse é o primeiro passo para o equilíbrio das contas dos Estados, não descartando a federalização de estatais para abatimento maior da dívida.

– É o Estado que vai decidir aquilo que é importante ou não a ser entregue para o abatimento da dívida. Neste caso, o governador Sartori, em uma demonstração de que faz o seu sacrifício, oferece terras que serão utilizadas para a reforma agrária. O governo federal aceita a ideia de receber, mas a decisão de entregar é do Estado – comentou Padilha.

ALIÁS

Mais pacientes com o governo Temer do que com Dilma, entidades empresariais como a Fiesp até agora se manifestaram de forma contida sobre a possibilidade de aumento de impostos.

sábado, 18 de junho de 2016

POLÍTICOS QUE ROUBAM



ZERO HORA 18 de junho de 2016 | N° 18559



GILBERTO SCHWARTSMANN*



No clássico do cinema italiano Ladrões de bicicleta (1948), de Vittorio De Sica, o desempregado Antonio Ricci consegue uma vaga de colador de cartazes. A exigência é ter bicicleta. Mas a sua é roubada. Ele tenta encontrá-la, com o auxílio do pequeno Bruno, seu filho, sem sucesso.

Desesperado, sem que o menino perceba, ele tenta roubar uma bicicleta. Mas é flagrado em pleno delito. Ao ver a cena, o pequeno Bruno entra em desespero. Por compaixão, a polícia o deixa ir embora. Mas não sem antes humilhá-lo.

Roubar nem sempre se deve a desvio de caráter. Pode ser fruto de um ato desesperado. E ainda que a pena seja, como no filme, o constrangimento público, exige punição exemplar. Esta regra é necessária à vida em sociedade.

Do batedor de carteiras ao ladrão de galinhas, do estelionatário ao larápio profissional ou o delinquente que mata para roubar, há bandidos para todos os gostos.

Há também doentes psiquiátricos que roubam por perda do juízo crítico. O cleptomaníaco rouba objetos que não possuem necessariamente valor. Na adolescência, há roubos transitórios por rebeldia. Álcool e droga são ingredientes facilitadores. E há o roubar dos doentes com transtorno de personalidade antissocial.

Penso que muitos ladrões da política brasileira representam variantes dessa condição patológica. À primeira vista, passam por chefes de família exemplares, com hábitos normais e até sucesso profissional. Mas, no fundo, são indivíduos perigosos, com vida dupla na delinquência.

Como os doentes psiquiátricos, eles não parecem moralmente afetados pelas consequências negativas de seus atos. Roubam sem demonstrar nenhum sentimento de culpa. E não exibem compaixão pelos que sofrem as consequências de seus atos.

Mesmo tendo acumulado riqueza suficiente para uma vida nababesca, algo os faz persistir, compulsivamente, na atividade delituosa. Pois têm a certeza da impunidade. E veem-se acima da lei e na crença, até há pouco verdadeira, de que, em nosso país, rico nunca vai para a cadeia.

Doentes ou simplesmente bandidos, não há a menor chance de que esses políticos possam ser resgatados moralmente. Tampouco imaginaria que sua incapacidade de sentir culpa pelos delitos praticados seja reversível. São incuráveis e reincidentes.

Resta à sociedade somente a alternativa de identificá-los e puni-los exemplarmente. E, sobretudo, contê-los. Para impedir que sua rede de influências e cumplicidades venha a sabotar a ação da Justiça.

*Médico

sábado, 11 de junho de 2016

A PÁ DE CAL



ZERO HORA 11 de junho de 2016 | N° 18553



INFORME ESPECIAL | Tulio Milman




Parecia, finalmente, uma autocrítica. Não era. Lula discursou durante a semana: Dilma Rousseff deve voltar ao poder para corrigir os erros do passado. Me enchi de esperanças. Finalmente, uma reflexão honesta sobre os caminhos errados daqueles que, durante tanto tempo, representaram a esperança de um projeto viável de esquerda.

Inspirado pela contundência de Lula, fui atrás dos erros. Desvendei o enigma ao ler a Resolução sobre Conjuntura do PT, parida no dia 17 de maio. Há menos de um mês, portanto. Transcrevo um trecho revelador: “Fomos igualmente descuidados com a necessidade de reformar o Estado, o que implicaria impedir a sabotagem conservadora nas estruturas de mando da Polícia Federal e do Ministério Público Federal; modificar os currículos das academias militares; promover oficiais com compromisso democrático e nacionalista; fortalecer a ala mais avançada do Itamaraty e redimensionar sensivelmente a distribuição de verbas publicitárias para os monopólios da informação”.

Leia de novo. Eu espero.

É de arrepiar. Em poucas linhas, o diretório nacional do PT joga na cara da sociedade o que aprendeu com os erros no passado: nada. Continua sonhando com um projeto de poder e não com um projeto de país. O partido defende, sem qualquer constrangimento, o aparelhamento ideológico do Estado. Transformar instituições em ferramentas partidárias.

Que tipo de modificação pretenderia a cúpula do PT, por exemplo, nos currículos das academias militares? Pretenderia, porque jamais conseguirá. Nossas Forças Armadas atingiram um grau de maturidade incompatível com quarteladas e bolivarianismos. Elas, sim, aprenderam com os erros no passado.

E no Itamaraty? Imagino o guru Marco Aurélio Garcia fazendo, pessoalmente, as entrevistas de seleção e promoção. “O senhor é da ala avançada? Então, bem-vindo ao novo mundo, camarada.”

É de apavorar.

Sem falar na visão velha, totalitária e conservadora de que é possível controlar a mídia com verbas publicitárias. Talvez na China, onde só existem jornais e tevês oficiais. E onde as redes sociais são censuradas. Compreendo o silêncio, mas tenho certeza de que muitos filiados e militantes petistas discordam deste descalabro.

Durante muito tempo, acreditei que Lula era uma solução inovadora, um modelo possível e eficiente de diálogo, de construção e de crescimento para o Brasil. Não me arrependo, mas acabou.

Qualquer projeto político só merece ser levado a sério se assumir como premissa a sua transitoriedade. O PT ainda nem conseguiu refletir sobre os erros do passado, mas foi além: já plantou os do futuro.

quarta-feira, 8 de junho de 2016

DOIS GOVERNOS EM BRASÍLIA


 


ZERO HORA 08 de junho de 2016 | N° 18550


+ ECONOMIA | Marta Sfredo





Há uma divisão de poder no Planalto Central, e não se trata do presidente interino, Michel Temer, e da presidente afastada, Dilma Rousseff. Uma parte da gestão provisória causa dor de cabeça e outra permite acalentar esperanças. No primeiro caso, estão os envolvidos em investigações. No segundo, estão integrantes da equipe econômica, a exemplo do indicado para a presidência do Banco Central (BC), Ilan Goldfajn.

Na sabatina feita ontem no Senado, Ilan não enfrentou exatamente um desafio – cascas de banana foram previsíveis e quase ingênuas –, mas também não tropeçou nas próprias palavras, mais do que se pode dizer de muitos colegas de governo. Mesmo em um dia que começou incendiando os ânimos com o polêmico pedido de prisão de Romero Jucá, ministro por 11 dias, e dos presidentes do Senado, Renan Calheiros e afastado da Câmara, Eduardo Cunha, além de um adereço para o calcanhar para José Sarney, o mercado não se estressou. Preferiu confiar nas palavras melodiosas, ao ouvido dos investidores, do futuro presidente do BC: mais autonomia para a instituição, reconstituição do tripé macroeconômico – metas de inflação, câmbio flutuante e responsabilidade fiscal – e a explicação óbvia para o fato de ser “sócio” do Itaú Unibanco.

Como funcionário graduado, o economista tinha ações como parte da remuneração, como ocorre na grande maioria das companhias de capital aberto. Não era um acionista relevante da instituição financeira.

É verdade que o governo Temer foi “ajudado” pelo cenário externo. Outro banco central, o Federal Reserve, dos Estados Unidos, havia dado sinais de adiamento da alta do juro prevista para este mês. Isso reduz a pressão sobre o dólar comercial, que ontem caiu para R$ 3,45, menor cotação desde a véspera da votação do impeachment no Senado. Na bolsa, o que auxiliou foi a melhora nas cotações das commodities.

Na aparência, o governo Temer tem sorte. Correu riscos desnecessários ao escolher ministros investigados – e outros ao respaldar nomes que terão futuro curto no governo caso as investigações da Operação Lava-Jato não sejam interrompidas. Teve sorte ao convencer um grupo de profissionais que acena com credibilidade, em um país com escassez dessa virtude, a aceitar cargos em seu governo. Ainda tem tempo de decidir com qual metade quer caracterizar seu período na Presidência.

Insistir em fazer de conta que limpou o Planalto de respingos da Lava-Jato pode ser mais cômodo politicamente, mas ameaça comprometer a gestão da economia, que selará seu futuro.

domingo, 29 de maio de 2016

A CORRUPÇÃO ACUADA



ZERO HORA 28 de maio de 2016 | N° 18537

EDITORIAL


O Supremo Tribunal Federal é o último refúgio da cidadania. Não pode se dobrar a pressões nem transigir com qualquer tipo de ilegalidade.

Seria ingenuidade imaginar que a Operação Lava-Jato vá acabar com a corrupção no país, mas a cada nova etapa da investigação comandada pelo juiz Sergio Moro, com participação ativa do Ministério Público e da Polícia Federal, corruptos e corruptores sentem-se mais acuados. Esta angústia da indecência pode ser percebida nos altos escalões da administração pública, especialmente entre os políticos que estão sendo investigados ou que têm algum tipo de envolvimento com práticas ilícitas.

As últimas gravações de conversas entre autoridades suspeitas revelam não apenas o pânico das delações como também a busca do foro privilegiado como uma tábua de salvação. Nesse sentido, chama a atenção o empenho de alguns políticos em alardear intimidade com ministros do Supremo Tribunal Federal, bravata que os magistrados rejeitam com veemência, como fez o ministro Luís Roberto Barroso, em recente fórum de debates promovido pela revista Veja. “É impensável supor que alguém tenha a capacidade de paralisar as investigações. Ou que qualquer pessoa pode ter acesso ao Supremo para parar as investigações. O ministro que chega ao Supremo só responde à sua biografia e a mais ninguém” – garantiu em nome de seus colegas de toga.

É essencial que seja assim. Como guardião da Constituição, o Supremo Tribunal Federal é o último refúgio da cidadania. Não pode se dobrar a pressões nem transigir com qualquer tipo de ilegalidade. Se os políticos estão inconformados com institutos legais, como a delação premiada nos moldes em que vem sendo executada pelos operadores da Lava- Jato, ou com a prisão de condenados em segunda instância, é à Corte Suprema que devem recorrer. Como ambas as demandas já foram apreciadas e chanceladas pelo tribunal superior, resta-lhes andar na linha para que não sejam flagrados em malfeitorias.

Vale para homens públicos e para todos os demais cidadãos, pois o que precisa mudar no país não é legislação, mas sim a mentalidade daqueles que ainda pensam que a corrupção continuará sustentada na impunidade. O apoio inequívoco da sociedade à Operação Lava-Jato mostra que os brasileiros, com as exceções referidas, escolheram o caminho da honestidade e da decência para reconstruir o país.

sexta-feira, 27 de maio de 2016

DEMOS GRAÇAS AOS DELATORES

 

ZERO HORA 27 de maio de 2016 | N° 18536


POLÍTICA + | Rosane de Oliveira



Os brasileiros que acreditam na importância da Operação Lava-Jato serão eternamente gratos a Sérgio Machado, o ex-senador sem escrúpulos que gravou os companheiros de partido e causou uma pororoca no PMDB. Depois de escancararem as manobras dos caciques para esvaziar a Lava-Jato, as gravações acabaram por reforçar a equipe que trabalha para desmantelar o maior esquema de corrupção já descoberto no Brasil. Como reconheceu o presidente do Senado, Renan Calheiros, agora eles são intocáveis.

Demos graças aos delatores, mesmo sabendo que não têm caráter. Sem covardes como Sérgio Machado e Delcídio Amaral, que entregam os amigos para livrar a própria pele, as pessoas de boa-fé continuariam acreditando nos discursos de que todos são a favor da Lava-Jato e que desejam, sinceramente, a elucidação de todas as denúncias.

Machado expôs Renan Calheiros, José Sarney e Romero Jucá, todos partidários da tese de que a Lava-Jato foi longe demais e que é preciso fazer manobras para deter o juiz Sergio Moro, para evitar que o ex-presidente da Transpetro “desça para Curitiba” e para proteger os companheiros acuados. As gravações revelam o apreço por aliados como o senador Aécio Neves, chamado de “o mais vulnerável do mundo, vulnerabilíssimo”, ou pelo líder do DEM, Pauderney Avelino, sobre quem Machado diz: “Um cara mais corrupto que aquele não existe”.

Que ninguém se iluda achando que esse pensamento é exclusividade da cúpula do PMDB. Lembremos que o ex-presidente Lula foi flagrado em grampos telefônicos dizendo coisas muito parecidas a companheiros do PT. A gravação de hoje não se sobrepõe à de ontem. Juntas, formam um mosaico do pensamento político da esquerda, do centro e da direita. Não era Lula que culpava a Lava-Jato pela paralisia do país e pelo desemprego? Não foi o PT que várias vezes pediu a cabeça do então ministro José Eduardo Cardozo, culpando-o por não interferir nas investigações e por ter perdido o controle da Polícia Federal? Por acaso eram diferentes as manifestações de Lula em relação ao juiz Sergio Moro? Não venha agora o PT se fazer de santo e tentar vender a ideia de que só os outros querem minar a Lava-Jato.

Renan, Sarney e Jucá não estão sendo originais quando conversam sobre a estratégia de se aproximar do ministro Teori Zavascki, o relator que “não é próximo de ninguém”. Em uma das gravações, Lula ordenava que a ministra Rosa Weber fosse procurada.

Ministros do STF não vivem em redomas. Recebem as partes, vão a reuniões sociais, conversam. É do jogo. O que não se pode achar normal é falar em pacto para aliviar os investigados na Lava-Jato, dizendo que o Supremo tem de estar junto num acordão com ares de anistia ou na implantação casuística de um sistema parlamentarista que, no plebiscito, a população rejeitou.



EM CASA, DILMA SE DEFENDE
Em Porto Alegre desde a tarde de ontem para passar o feriadão com a família, a presidente afastada Dilma Rousseff manifestou-se sobre as gravações divulgadas na imprensa nesta semana.

No Facebook, Dilma focou a explicação em trechos em que é citada pelo ex-presidente José Sarney. No diálogo com Sérgio Machado, ele comenta sobre os pagamentos ao marqueteiro João Santana e alerta: “Vão pegar a Dilma”.

Na postagem, a petista afirma os R$ 70 milhões pagos a João Santana foram devidamente registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Dilma afirmou também que a tentativa de envolvê-la em “situações das quais ela nunca participou ou teve qualquer responsabilidade são escusas e direcionadas”.